Para especialista, mobile health provocará mudanças na cultura médica e em políticas públicas

Para Christopher James, o especialista em mobile-health do IEEE (principal associação global de engenheiros de tecnologia) e professor de engenharia biomédica da Universidade de Warnick, no Reino Unido, o grande ganho do desenvolvimento das tecnologias móveis aplicadas à saúde é mudar a cultura de relacionamento entre pacientes e profissionais de saúde, estabelecendo um canal muito mais permanente de interação. Além disso, diz ele, o fato de o paciente passar a ter mais informações sobre suas condições fisiológicas em tempo real e de maneira não intrusiva possibilitará às pessoas uma outra relação com a saúde.

Em entrevista ao Mobile World Congress, que aconteceu esta semana em Barcelona, esses são os grandes benefícios do casamento entre mobilidade e saúde. Mas há desafios imensos a serem superados ainda. O primeiro é justamente essa mudança de cultura. “Muitas vezes, os médicos, e os próprios sistemas de saúde, não querem e não estimulam um contato mais permanente com o paciente. Mas no momento em que os dados estão sendo colhidos e essas informações chegam aos profissionais de saúde, isso pressupõe que do outro lado alguém esteja atento aos resultados permanentemente”, diz ele.

Da mesma forma, diz Christopher James, é preciso que se crie o costume de acompanhar as condições de saúde não por um exame específico ou consultas eventuais, mas por um acompanhamento muito mais permanente. “O monitoramento em tempo real permite que se construa um histórico muito mais detalhado das condições de saúde das pessoas. Com isso, e com o tempo, é possível começar a perceber padrões que permitirão saber com muito mais antecedência a ocorrência de uma determinada condição de saúde ou a predisposição a ela”, diz o especialista.

Ele é um crítico da atual onda de dispositivo de fitness que proliferam nesse primeiro momento de casamento entre mobilidade e saúde digital. “Hoje o que se faz é coletar informações que são até importantes, como batimentos cardíacos e nível de atividade e de sono, mas apenas jogar isso para o usuário, sem que ele tenha a menos condição de avaliar o significado daquilo para a saúde”. Desse fato decorre um grande risco de excessos e interpretações equivocadas baseadas apenas em senso comum. “Começamos a coletar dados, mas ainda há pouca coisa sendo feita do outro lado, do lado dos profissionais de saúde que poderiam analisar e acompanhar esses dados”.

Ele lembra que também existe um certo marketing sobre esses sensores embarcados em relógios e pulseiras de fitness, mas há pouca certificação de qualidade sendo feita. “Se colocar cinco pulseiras em uma mesma pessoa no mesmo momento, possivelmente teremos cinco resultados diferentes”, diz ele. Um esforço de padronização e certificação de qualidade dessas informações seria necessária para que se tivesse algum valor científico nos dados coletados.

Por fim, ele lembra de um outro aspecto importante da tecnologia de saúde embarcada em dispositivos móveis, que é a chance de simplificar algumas tarefas de acompanhamento que não requerem sequer um sensor. “Existe uma infinidade de condições físicas, neurológicas, psquiátricas, que podem ser acompanhadas apenas com aplicativos simples”, diz ele, exemplificando com questionários sobre variações de humor das pessoa, que podem indicar algumas condições em diagnósticos específicos, ou operações lógicas e matemáticas, que podem ajudar no acompanhamento de condições neurológicas.

Para ele, os governos em geral ainda estão muito distantes de entenderem os benefícios que as aplicações digitais poderão trazer ao conjunto da população em termos de saúde. “Passa pela questão de mudança de mentalidade, mudança de cultura e mudanças nos processos que há décadas fazem esses sistemas de saúde funcionar”, diz o pesquisador.

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