Novo estudo da Fundação do Câncer revela que mortalidade por cânceres ligados ao HPV é alta

Estudo da Fundação do Câncer, divulgado nesta terça (5), revela que cerca de 6 mil casos de câncer relacionados ao HPV (Human Papilomavirus) poderiam ser evitados por meio da prevenção primária a cada ano, isso sem contar os 17 mil casos estimados anualmente de câncer do colo do útero, tipo mais frequente associado pelo HPV. A quarta edição da publicação info.oncollect, intitulada ‘O impacto do HPV em diferentes tipos de câncer no Brasil’, analisou cinco tipos de câncer: orofaringe, ânus e canal anal, vagina, vulva e pênis. A publicação traz informações que mostram que a maioria dos pacientes já chega às unidades de saúde em estágios avançados da doença. Os dados destacam ainda que o não adoecimento por esses tipos de cânceres  preveníveis em grande parte por meio da vacinação, poderia impactar os custos da Saúde no Brasil: “além de evitar 4,5 mil mortes/ano, o que equivale a um expressivo número de 75% de mortalidade, a prevenção iria reduzir os gastos com diagnóstico, tratamento e internações, inclusive abrindo espaço para pacientes com outros tipos de câncer no sistema de saúde”, analisa Luiz Augusto Maltoni, diretor executivo da Fundação do Câncer.

A análise do perfil dos pacientes com algum desses cinco tipos de cânceres revela que a maioria, considerando homens e mulheres, tem mais de 50 anos de idade (78%), possui baixa escolaridade (64%) e é negra (56% e 53%, respectivamente).

Estágios da doença e tempo de tratamento

Em relação ao estadiamento, os pacientes com câncer de orofaringe, tumor que se desenvolve em parte da garganta, são diagnosticados em estágios avançados da doença em todas as regiões do Brasil (homens 88% e mulheres 84%). Em relação ao tempo entre o diagnóstico e o tratamento, o que se observa é que a maioria dos homens acometidos pela enfermidade (65%) inicia o tratamento em até 60 dias, quando encaminhados sem diagnóstico prévio.

“As regiões com maiores tempos de espera entre o diagnóstico e o tratamento são Nordeste (44%) e Sudeste (36%). Já entre aqueles encaminhados com algum diagnóstico, somente 39% têm o tratamento iniciado em até 60 dias. Já as mulheres que chegam com o diagnóstico da doença enfrentam maior tempo de espera (62%), sendo que no Centro-Oeste (70%), Sudeste (65%) e Norte (64%), o tempo de espera delas é maior que o tempo-médio do país”, destaca a bióloga Rejane reis, uma das pesquisadoras do boletim.

O estadiamento do câncer de ânus e canal anal chama atenção, com um significativo percentual de pacientes chegando à unidade de saúde em estágios avançados da doença (55% para homens e 54% para mulheres). A maioria dos homens (66%) encaminhados às unidades de saúde sem diagnóstico prévio inicia o tratamento em até 60 dias. “Por outro lado, aqueles encaminhados com o diagnóstico em mãos têm o maior tempo até o tratamento: somente 40% inicia o tratamento dentro dos 60 dias. Com relação às mulheres, das que chegam ao hospital sem o diagnóstico, 64% conseguem iniciar o tratamento em até 60 dias. Porém, daquelas que chegam com o diagnóstico em mão, apenas 37% conseguem começar o tratamento dentro do mesmo tempo”, ressalta Yammê Portella, estatística e pesquisadora da Fundação.

Em relação ao câncer de pênis, 43% dos casos são diagnosticados já em estágios avançados. As regiões Norte e Centro-Oeste enfrentam os maiores percentuais de câncer em estadiamento avançado (55%), enquanto o Sudeste tem o menor percentual (34%). Com relação ao tempo entre o diagnóstico e o tratamento, é possível perceber uma diferença enorme com 82% dos homens sem diagnóstico prévio iniciando o tratamento em até 60 dias, enquanto apenas 37% daqueles com diagnóstico iniciam tratamento no mesmo período.

No caso do câncer de vulva, mais de 50% dos tumores chegam na fase inicial da doença. A região Sudeste apresenta o maior percentual de mulheres com neoplasia que chegam com estadiamento inicial da doença (60%). Já com relação ao tempo de espera entre o diagnóstico e o tratamento, pode ser observado maior período de espera para tratamento das mulheres que chegam ao hospital já com o diagnóstico em mãos, se comparado às que chegam sem o diagnóstico (apenas 26% são atendidas em até 60 dias, em todo o país). A região Norte apresenta o menor percentual brasileiro (16%) de mulheres que chegam ao hospital com diagnóstico e iniciam o tratamento em até 60 dias.

O câncer de vagina apresenta uma distribuição semelhante relativa ao estadiamento clínico da doença. A região Centro-Oeste é a que tem o maior percentual de mulheres chegando às unidades de saúde em estágios iniciais da doença (63%). Entre o diagnóstico e o tratamento das mulheres que chegam à unidade hospitalar sem diagnóstico e sem tratamento, 64% recebem o tratamento em até 60 dias após o diagnóstico. Comparado com as outras regiões, o Sudeste possui o maior percentual de mulheres que receberam tratamento após 60 dias do diagnóstico (42%). Os dados mostram que o percentual de mulheres com a doença que chegam com diagnóstico na unidade hospitalar e recebem o tratamento após 60 dias é alto (66%).

“Os dados apontam que as pessoas que chegam ao hospital com o diagnóstico em mãos, em sua maioria, são tratadas com mais de 60 dias, o que fere a lei 12.732/12 que garante ao cidadão iniciar o tratamento dentro desse prazo após o diagnóstico da doença. Isso evidencia que há um fluxo falho no sistema de saúde, sugerindo demora na investigação na atenção secundária e no encaminhamento para a terapêutica”, atenta o diretor executivo da Fundação.

Prevenção, detecção e controle

Segundo Alfredo Scaff, epidemiologista e consultor médico da Fundação do Câncer, essa edição do info.oncollect pode auxiliar no direcionamento das políticas públicas específicas. “Esses dados reforçam a importância de estratégias eficazes de detecção precoce, tratamento rápido e acesso igualitário aos cuidados de saúde. As informações sobre o tempo entre o diagnóstico e o tratamento apontados na publicação mostram que há um problema no fluxo da rede de saúde. Compreender as disparidades regionais é essencial para desenvolver intervenções direcionadas e garantir melhores resultados para todos os pacientes.”

Flávia Miranda, consultora médica da Fundação do Câncer, enfatiza a necessidade crucial de medidas preventivas, especialmente no contexto dos cânceres relacionados ao HPV. “A vacinação é uma medida fundamental para a prevenção desses tipos de câncer, sendo um recurso disponível no SUS, para meninos e meninas, entre 9 e 14 anos, além das mulheres e dos homens de 15 a 45 anos de idade vivendo com HIV/AIDS, transplantados e pacientes oncológicos. Mas o que se observa é que apesar da imunização ser disponibilizada gratuitamente no SUS, ainda há uma dificuldade para atingir a cobertura vacinal adequada. E essa dificuldade se mostra maior quando se trata do esquema vacinal completo, ou seja, contemplando as duas doses.” Ela completa ainda que é preciso olhar para a prevenção ao HPV para além do câncer do colo do útero, o mais prevalente entre as doenças causadas pelo Papilomavirus. “O avanço do controle dos tipos de câncer relacionados a esse vírus depende muito da conscientização no aumento da cobertura vacinal, aliada à redução das barreiras de acesso, garantindo e melhorando a condição da chegada dos pacientes às unidades de saúde, desde seu diagnóstico até o tratamento”.

A médica alerta que 8 a cada 10 pessoas serão infectadas pelo HPV em algum momento da vida. “Portanto, vacinar significa diminuir riscos”, salienta.

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