Crise no sistema de saúde suplementar: A culpa é das operadoras?

Não é novidade que o sistema de saúde suplementar vive profundos desafios. O contexto é conhecido. Os dados são públicos. O cenário está escancarado. Por anos, a discussão foi sobre a causa. Hoje, sinto que estamos começando a procurar saídas – mas o debate ainda é raso.

Ainda buscam-se culpados, não soluções. Nesse sentido, um dos maiores erros é colocar as operadoras como únicas ou primárias responsáveis pelo caos que acomete o setor. A tentação para isso é grande e facilmente justificável. As operadoras transacionam o dinheiro que por lá parece ficar, além de serem as donas de produtos dos quais parecem ter total ingerência.

Agradando ou não parte da opinião pública, a realidade é outra. Essa visão consumerista só traz miopia à análise e menospreza a complexidade do problema. Em 2023, segundo dados contábeis compilados pela ANS, Agência Nacional de Saúde Suplementar, a receita das operadoras foi de R$307.4 bilhões.

Com uma sinistralidade média de 84%, o setor apresentou, no ano, um prejuízo operacional de R$5.9 bilhões – uma melhora em relação a 2022, quando o resultado negativo foi de R$10.6 bilhões. Considerando as receitas financeiras, o lucro líquido consolidado foi de R$1.8 bilhão, 0.58% da receita. Das 558 operadoras registradas, 132 tiveram prejuízo na última linha.

É preciso coragem para operar. Operadoras não são santas. Elas têm sua parcela de culpa, assim como todos os que compõem o sistema de saúde. Tudo será melhor quando pararmos de achar que há mocinhos e bandidos. Devemos promover um debate sério e profundo, olhando com atenção os mecanismos de incentivos, muitas vezes equivocados, que formam o setor e direcionam o comportamento dos agentes.

Certa vez, ouvi uma analogia que define bem o que se passa. Em um teatro, todos assistem à peça sentados. Naturalmente, por conta do espectador da frente, não é possível enxergar todo o palco. Com isso, alguém da plateia decide levantar. Assim, ele terá visão plena do espetáculo. Ocorre que, agora, quem estava sentado atrás não enxerga mais nada e também levanta. No final, todos assistem à peça de pé e, provavelmente, vendo menos do que quando estavam sentados.

Agora, precisamos que alguém tenha a coragem de voltar a sentar e fazer o que é certo. Costumo dizer: essa não é uma postura ingênua, é uma iniciativa consciente e produtiva no longo prazo. Ganha quem der o primeiro passo, ganham todos que o seguirem – e, por consequência,  ganha também o setor como um todo.

Felipe Baeta, CEO da Piwi.

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