O Hospital Israelita Albert Einstein iniciou um ensaio clínico para avaliar a segurança de um protocolo para tratamento de pacientes transplantados de medula óssea com infecção por citomegalovírus (CMV). O IMMUNECELLVIR-I, terapia celular desenvolvida por pesquisadores da instituição, visa tratar aqueles que, após 14 dias de tratamento, não respondem aos antivirais. A infusão endovenosa consiste em linfócitos T específicos, que reconhecem a camada externa de proteínas que envolve a partícula viral do CMV e o combatem.
Luciana Cavalheiro Marti, uma das responsáveis pelo estudo, explica que existem duas formas para se conseguir a resposta imune do organismo. A primeira delas é natural, na qual uma célula imune pode migrar para o local da infecção, reconhecer células infectadas e eliminá-las (resposta celular), além de induzir a produção de anticorpos (resposta humoral). A segunda é a que ocorre a partir do estímulo de vacinas, por exemplo, em que o corpo produz uma resposta ao próprio vírus (atenuado ou inativado) ou seu material genético, com a produção de anticorpos e o preparo de células de memória antes de se contrair uma infecção.
Até hoje, os pacientes transplantados de medula óssea infectados ou com CMV reativado são tratados com medicamentos antivirais comuns. Agora, com um olhar inovador, os pesquisadores buscam sanar as infecções sem exigir tanto do sistema imune dessa população, que é sabidamente comprometido.
“Para o estudo, nós desenvolvemos essa resposta celular pronta, que é aplicada no paciente por meio de uma infusão intravenosa e o beneficia imediatamente, já que estamos lidando com indivíduos com grau de imunidade muito baixo — ou até mesmo sem imunidade — e que já estão se tratando com outros medicamentos há 14 dias, sem resultados positivos”, diz.
A pesquisadora detalha, ainda, que a imunidade pronta transferida precisa de uma compatibilidade mínima de classe 1 — quando não se faz necessário uma compatibilidade total da célula. Isso porque “a quantidade de células é pequena e muito específica, o que garante que um maior número de pacientes infectados por CMV usufrua do protocolo”.
O citomegalovírus é o maior membro da família de vírus Herpesviridae e infecta quase toda população em algum momento da vida. Acredita-se que mais de 80% da população já teve contato com o vírus. Em sua maioria, os casos da infecção por CMV não apresentam sintomas e nem causam doenças em indivíduos imunocompetentes — aqueles em que o organismo é capaz de reagir ou combater adequadamente microrganismos patógenos ou parasitas. Entretanto, após uma primeira manifestação, o vírus permanece em estado de latência, podendo ser reativado em diferentes situações, principalmente nos casos de alterações imunológicas.
As infecções e reativação de infecções por citomegalovírus humano (hCMV) são causas frequentes de complicações em pacientes submetidos a transplantes de medula óssea. Ao lado delas também aparecem as ocorrências de outras infecções virais por Adenovírus, Epstein-barr (EBV), Poliomavírus (vírus BK) e HHV-6.
“Pacientes transplantados são considerados imunocomprometidos. Neles, o sistema imunológico não consegue reagir de forma adequada à infecção ou reativação do CMV, causando, assim, uma infecção extremamente grave, que pode colocar em risco a vida da pessoa”, explica Nelson Hamerschlak, coordenador do Programa de Hematologia e Transplantes de Medula Óssea do Einstein.
“Se esta terapia para o CMV se provar tão segura e eficaz neste ensaio clínico como demonstramos nos ensaios pré-clínicos, será uma opção importante e que poderá ser expandida para tratar outros vírus, alguns para os quais ainda não há tratamento disponível”, afirma Hamerschlak.