Com marco regulatório que propõe a proibição de medicamentos de marcas próprias, mercado e consumidor saem perdendo

Há pelo menos dez anos, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) permite a possibilidade de inserção da logomarca das empresas que comercializam remédios – distribuidoras, farmácias e drogarias – nos rótulos de embalagens de medicamentos. São as famosas medicações de marcas próprias, que custam até 20% menos e contribuem para uma concorrência de mercado que favorece a todos.

Não é de hoje que o mercado de marcas próprias, de maneira geral, está crescendo no Brasil: alcançou 32,8 milhões de lares no ano de 2017, um crescimento 40% maior em relação às outras marcas. Além disso, o país responde por 36% do setor em toda a América Latina e a expectativa é que cresça ao menos 21% até o final de 2020. No segmento de produtos farmacêuticos, as marcas próprias também ganham cada vez mais destaque, já que, apenas no ano de 2018, tiveram um aumento nas vendas de 19,8%, segundo dados divulgados pela Nielsen.

Em todos esses anos, não foi registrado sequer um problema em relação a esses produtos, que antes de serem comercializados, são devidamente regulamentados pela própria ANVISA. Além disso, as indústrias que os produzem, também habilitadas pela ANVISA, oferecem aos consumidores todo o suporte via SAC, registrando qualquer suspeita de eventos adversos e esclarecendo dúvidas sobre o uso correto da medicação. É importante ressaltar que os medicamentos de MPs passam por criteriosas auditorias em todo o seu sistema de qualidade.

Mesmo com os resultados positivos do uso de marcas próprias pelas farmácias, drogarias e distribuidores, foi divulgado, em julho, uma consulta pública que propõe a proibição da comercialização de medicamentos de MPs. Atualmente, novas normas estão passando por consulta pública e a de número 815/2020, em seu Artigo 9°, apresenta o seguinte texto: “não será admitida a inclusão de nome, marca, logomarca e/ou identidade visual dos estabelecimentos que somente comercializam ou dispensam medicamentos diretamente ao consumidor, como distribuidoras, farmácias e drogarias”.  Não é difícil listar as razões pelas quais essa lei não deva ser aprovada. Afinal, os prejuízos da medida, de fabricantes até o cliente final, serão imensos, pois perderemos em termos de concorrência deixando de oferecer produtos com qualidade e regulamentados com custos menores ao consumidor.

Além disso, expõe uma incoerência por parte da ANVISA, já que a agência possui um grande histórico de regulamentação das marcas próprias no setor – o que mostra, no mínimo, uma contradição muito grande. A venda de medicamentos de marcas próprias fomenta uma concorrência natural, com potencial de redução do valor dos produtos, tornando-os, consequentemente, mais acessíveis à população, o que é, antes de tudo, um direito garantido pela Constituição Federal.

Conforme o artigo 2º da Constituição, “o direito à segurança é prerrogativa constitucional indisponível, garantido mediante a implementação de políticas públicas, impondo ao Estado a obrigação de criar condições objetivas que possibilitem o efetivo acesso a tal serviço”. Tendo isso em vista, o novo texto apresentado pela ANVISA contraria todo o regime já estabelecido, mudando totalmente o sistema de MPs em medicamentos, que funciona há mais de dez anos. Não existe nenhuma justificativa plausível que fundamente a proibição, e não há respaldo técnico, já que a cadeia farmacêutica como um todo é fiscalizada pela mesma agência, e assim continuará sendo.

De acordo com a ANVISA, o novo marco regulatório visa a segurança do usuário e está relacionado à farmacovigilância e suas respectivas normas e obrigações. Em outras palavras, a agência afirma que a medida busca garantir que não ocorram dúvidas, erros ou confusões pelo paciente e/ou consumidor quanto à procedência do medicamento, além de possibilitar que o usuário tenha certeza quanto à rastreabilidade do medicamento, para o caso de notificações de um evento adverso ou queixas em decorrência do uso.

No entanto, como presidente da Associação Brasileira de Marcas Próprias e Terceirização (ABMAPRO), posso afirmar, com total convicção, que todo medicamento de MP no Brasil é fabricado por uma indústria com autorização de funcionamento, concedida pela própria ANVISA. A ABMAPRO entende que o povo brasileiro tem capacidade, inteligência e, especialmente, responsabilidade para dirimir e comprar o que lhe é factível de ser adquirido.

Além de todos esses argumentos, é importante ressaltar que medicamentos de marcas próprias são comuns em diversos países, sem nenhum tipo de prejuízo ou risco ao consumidor. É o que acontece, por exemplo, na maior parte dos países europeus, além de Estados Unidos e Chile. Existem estudos, inclusive, que são de conhecimento público e comprovam que esses medicamentos são absolutamente exitosos perante a população e que induzem a significativa queda nos preços.

É importante ressaltar, também, que a Lei da Liberdade Econômica (Lei n.º 13.874/2019) reforça a livre iniciativa, livre concorrência e o livre exercício da atividade econômica, além da desburocratização tão prejudicial ao Estado. Outro questionamento importante e que quero deixar para reflexão é: quantos foram os eventos que motivaram a ANVISA à alteração da legislação? O que ocorreu nos últimos dez anos que colocou em dúvida a eficiência ou a credibilidade dos medicamentos de marcas próprias? Qual a real motivação para que a ANVISA, que sempre regulou e regula esses medicamentos – ainda que não tendo nada, absolutamente nada, que possa evidenciar que existe um risco sanitário –  acabe com as Marcas Próprias de medicamentos no Brasil?

Neste sentido, possuo uma opinião muito clara, sendo a favor da supressão do artigo 9º do marco regulatório divulgado pela ANVISA, visto que não há nenhum prejuízo ao consumidor e à farmacovigilância. Assim, convido você, consumidor, a se juntar a nós para defender esta causa tão importante e não permitir que essa lei seja aprovada, já que pode trazer inúmeros prejuízos – muitos citados anteriormente neste artigo – ao povo brasileiro.

Neide Montesano, presidente da Associação Brasileira de Marcas Próprias e Terceirização (ABMAPRO).

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