Precisamos proteger a terceira idade

O perfil populacional brasileiro está em transformação e passa por um processo de franco envelhecimento. O que não tem acompanhado essa inevitável mudança é a forma como pensamos, atuamos e promovemos os cuidados com a terceira idade – mudança essa que é urgente, dado o salto de 57% de pessoas com mais de 65 anos no país em 2022 na comparação com o Censo de 2010.

Ao passo em que a nossa população envelhece, a violência a que está submetida avança. Pesquisadoras da Universidade Federal Fluminense (UFF) e da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) identificaram que de 2020 até 2023, mais de 408 mil denúncias de violência contra a pessoa idosa foram registradas no país, sendo 35% delas apenas no ano passado.

A vulnerabilidade dos nossos idosos é um fator de grande contribuição para o percentual elevado de denúncias. É sabido que, com o passar dos anos, o ser humano se torna mais propenso a desenvolver determinados tipos de doenças, como as crônicas. E, ainda, quanto mais idoso, mais chances de apresentar ou agravar as chamadas doenças degenerativas, como demências, Doença de Alzheimer e Parkinson.

As doenças degenerativas se caracterizam pelo progressivo declínio das funções cognitivas, como a memória, a linguagem e a capacidade de atenção. Não à toa, os idosos se tornam alvos ideais para violência física, psicológica, patrimonial, abuso sexual, violação de direitos, além de negligência e abandono por parte de seus cuidadores – esses são, inclusive, os suspeitos mais comuns, principalmente os familiares, com a maioria das violações cometidas em ambiente doméstico.

Idosos com doenças degenerativas demandam uma rede de suporte e cuidados que favoreça a sua segurança e bem-estar para que possam continuar fazendo as suas atividades.  O que vemos, entretanto, é diferente.

Essas pessoas são estigmatizadas, e isso cria condições para os comportamentos criminosos. De acordo com o relatório “Attitudes to Dementia” da Alzheimer’s Disease International de 2019, 18% do público geral acredita que as pessoas vivendo com demência são impulsivas e imprevisíveis. O estigma se estende à classe médica: 13,2% dos profissionais de saúde pensam que esses pacientes são perigosos.

Permitir que as gerações mais velhas continuem se desenvolvendo e participando das comunidades, ao mesmo tempo em que recebe serviços adequados para as suas necessidades por um período prolongado é um caminho para frear o ciclo de abuso e aumentar a qualidade de vida das pessoas idosas, uma população da qual nós, no futuro, também faremos parte.

Marcelo Valadares, neurocirurgião e pesquisador da Unicamp.

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