Microsoft e Nuance fazem parceria para que médicos mantenham foco no atendimento de seus pacientes

Imagine uma visita ao consultório do seu médico. Ele pergunta como você está se sentindo, se seu medicamento está funcionando ou se a dor no ombro de uma queda antiga ainda está incomodando. Durante toda a conversa, o foco dele está inteiramente em você. Ele olha nos seus olhos, e não para a tela do computador. Não está movendo o mouse em busca de um registro antigo ou mesmo digitando algo no teclado para inserir um código de diagnóstico. Parece o cenário ideal, mas, como a maioria das pessoas sabe, isso está longe de ser o padrão.

Especialistas dizem que, em uma sala de exames do futuro aprimorada pela inteligência artificial, o médico poderá chamar um resultado de laboratório ou prescrever um novo medicamento com um simples comando de voz.

Ele não ficaria distraído ao digitando sintomas no seu registro eletrônico de saúde. Ao final da visita, os elementos essenciais da conversa estariam gravados com segurança, e divididos em uma documentação concisa que poderia ser compartilhada com enfermeiros, especialistas, companhias de seguros ou qualquer outra pessoa – ou parte – responsável pelos seus cuidados.

Uma nova parceria estratégica entre a Microsoft e a Nuance Communications Inc. está trabalhando para fornecer esse nível de inteligência clínica ambiental às salas de exames, permitindo que a detecção ambiental e a IA conversacional cuidem das tarefas administrativas mais onerosas. Elas serão responsáveis pela documentação clínica a partir de diálogos entre profissionais de saúde e seus pacientes, com objetivo de permitir que médicos possam se dedicar totalmente ao seu público.

Ainda existem grandes desafios técnicos para chegarmos a esse cenário ideal, mas, as duas empresas acreditam possuir uma base sólida para construí-lo com os recursos tecnológicos de inteligência clínica ambiental (IAC) da Nuance, apresentada no início de 2019, e com o serviço EmpowerMD Intelligent Scribe, da Microsoft. Ambos utilizam IA para aprender como converter conversas médico-paciente em documentação clínica útil, potencialmente reduzindo erros, economizando tempo e melhorando a experiência geral de ambas as partes.

“Os médicos estudaram medicina porque queriam ajudar e curar as pessoas, mas, hoje, passam muito tempo fora do processo de atendimento”, disse Joe Petro, vice-presidente executivo e diretor de tecnologia da Nuance. “Eles estão inserindo dados para garantir que a ficha mais apropriada à situação possa ser criada. Eles estão capturando informações sobre saúde da população e as medidas de qualidade tomadas. E, embora esses dados sejam importantes, eles estão longe foco principal de um médico no tratamento do paciente”.

Para cada hora em que estão envolvidos no atendimento direto ao paciente, profissionais que prestam serviços primários de saúde passam cerca de duas horas cuidando de tarefas administrativas, de acordo com pesquisadores do Annals of Family Medicine. Se eles não anotarem uma reclamação ou mesmo um plano de tratamento durante – ou logo após – um exame, essa documentação irá acumular com o passar do dia. Em outro estudo recente, publicado pelo Annals of Internal Medicine, os médicos relataram uma a duas horas de trabalho extra após o expediente a cada noite, e boa parte delas relacionadas a tarefas administrativas.

“A mudança para o uso de registros eletrônicos de saúde  é bem-intencionada, e já proporcionou alguns benefícios importantes”, disse Ranjani Ramamurthy, diretora sênior da Microsoft Healthcare – que lidera a pesquisa EmpowerMD da empresa. “Com ela, as pessoas não precisam mais se preocupar em não conseguir ler a caligrafia do médico ou encontrar as informações certas em fichas de papel. Mas a consequência não intencional disso é que os médicos são, algumas vezes, forçados a se concentrar mais em seus computadores do que em seus pacientes”.

Após iniciar sua carreira em ciência da computação, Ramamurthy voltou à escola para se formar em medicina e realizar pesquisas sobre o câncer. Mas, enquanto caminhava pelos corredores do hospital todos os dias, não pôde deixar de pensar que estava perdendo a oportunidade de usar sua experiência para criar soluções tecnológicas que pudessem revigorar a relação médico-paciente.

Ela observou que a maioria dos profissionais de saúde entra nessa área para usar habilidades e experiências para tratar pacientes, e não para ficar presa a um teclado.

“Precisamos trabalhar na construção de sistemas que cuidem dos médicos para que eles possam fazer o que fazem melhor, que é cuidar dos pacientes”, disse.

Criada com Microsoft Azure, essa nova tecnologia combinará os pontos fortes das duas empresas no desenvolvimento de soluções de IA de detecção ambiental e conversação. Isso inclui audição ambiental (com o consentimento do paciente), ativação de ações por voz, biometria por voz, resumo de documentos, compreensão natural de linguagem, inteligência clínica e conversão de texto em fala.

A Nuance fornece solução para documentação clínica e suporte para tomada de decisões para médicos com o apoio de IA. Investindo em parcerias estratégicas com os principais fornecedores de registros eletrônicos de saúde, a empresa passou décadas desenvolvendo soluções de processamento e reconhecimento de voz clinicamente relevantes, como a plataforma Dragon Medical One – que permite aos médicos inserir, por meio de ditado, informações relevantes ao histórico do paciente. As tecnologias de IA de conversação da Nuance já são usadas por mais de 500.000 médicos em todo o mundo, bem como por 90% dos hospitais dos EUA.

Por sua vez, a Microsoft investe em pesquisas para IA e tecnologias de assistência médica (orientadas por parceiros), suas relações comerciais com quase 170.000 organizações de assistência médica e seus serviços de nuvem e IA focados em empresas – que aceleram e permitem soluções comerciais escaláveis. Por exemplo, em outubro de 2019, a Microsoft anunciou uma colaboração estratégica para combinar sua tecnologia de IA com a experiência em ciências da vida da Novartis, com objetivo de enfrentar os desafios no desenvolvimento de novos medicamentos.

Para outras áreas, o Azure Cognitive Services oferece ferramentas de IA de fácil implementação para reconhecimento de fala, visão computacional e reconhecimento de voz, além de serviços de nuvem confiáveis que podem dar apoio em questões de privacidade e regulamentação para organizações de saúde.

Como parte do acordo, a Nuance migrará a maior parte de sua infraestrutura interna e produtos hospedados para o Microsoft Azure. A empresa já é cliente do Microsoft Office 365 para seus mais de 8.500 funcionários em todo o mundo, capacitando-os com as mais recentes ferramentas de colaboração e comunicação, incluindo o Microsoft Teams.

“A captura de conversas entre duas pessoas é um problema técnico bem conhecido, e diversas companhias já tentaram decifrá-la”, disse Petro. “Essa parceria reúne duas superpotências confiáveis em assistência médica para resolver alguns dos desafios mais difíceis, além de alavancar os avanços mais inovadores que fizemos em IA, fala e processamento de linguagem natural”.

“As empresas vão expandir o sucesso prévio da Nuance com a IAC, e esperam que a tecnologia seja levada a um conjunto inicial de especialidades médicas no início de 2020 – com a consequente expansão para outras áreas da medicina nos próximos anos”, disse o executivo. Inicialmente, o resultado da IAC será conferido por um especialista para averiguar a qualidade do material e gerar dados para treinos adicionais dos modelos de IA.  Uma vez que o sistema tenha comprovado sua precisão para um determinado médico, a documentação da IAC será enviada diretamente a este médico, que poderá revisá-la, fazer as alterações necessárias e assinar um plano de tratamento em tempo real.

Com o consentimento do paciente, a IAC vai receber e sintetizar com segurança conversas entre as partes, integrar esses dados com informações de um registro digital, preencher o prontuário do paciente e ajudar o próprio registro a fornecer recomendações inteligentes ao médico.

Inovações no processo de reconhecimento de fala a partir de várias fontes, compreensão da linguagem e a visão computacional vão permitir que essas ferramentas possam ouvir o encontro entre médicos e pacientes (desde que haja consentimento), identifiquem para qual parte do corpo alguém está apontando (enquanto descreve verbalmente o tipo de dor), extraiam as informações médicas relevantes desse encontro e as traduzam em ações, documentação e sugestões de tratamento clínico.

“Nós reconhecemos que a redução dessa carga na documentação clínica é apenas o começo”, apontou o Dr. Greg Moore, vice-presidente corporativo da Microsoft para tecnologia de saúde e alianças. “À medida que essa inteligência artificial melhora e se torna mais capaz, ela poderá entender de forma profunda o que está acontecendo enquanto observa médicos e enfermeiras em suas tarefas diárias. A IA ambiental será capaz de trabalhar em conjunto com os sistemas de registros eletrônicos para converter as observações captadas em ações de suporte efetivas”.

Por exemplo, um sistema conectado à uma IA pode aprender a reconhecer situações em que o médico fala com seu paciente sobre um novo medicamento. Automaticamente, esse sistema pode revisitar as conversas anteriores, bem como o histórico de consultas, para reduzir o risco de uma interação entre diferentes medicamentos ou mesmo uma reação alérgica. Ele também pode minerar os dados de um registro clínico mais complicado, combinando com novos sintomas apresentados, e oferecer sugestões para diagnósticos em potencial – pendentes da avaliação médica.

Além disso, as duas empresas abrirão a plataforma IAC para um ecossistema de parceiros que podem trazer outras inovações valiosas em termos de IA para a sala de exames, ou mesmo para o lado do leito – onde o dispositivo de detecção ambiental estará presente.

“Queremos que a inteligência clínica ambiental ajude o registro eletrônico a fornecer recomendações no momento necessário – não três dias depois, no portal do paciente ou quando uma enfermeira der um retorno. Isso deve acontecer quando o médico e o paciente estiverem frente a frente e essas informações forem relevantes para o tratamento”, disse Ramamurthy.

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