Novo tratamento para o AVC reduz sequelas após a doença

Reconhecer a importância do tempo é primordial em saúde, afinal diagnósticos precoces acompanhados de tratamentos emergenciais significam, em grande parte dos casos, uma vivência com sequelas indesejáveis ou a morte. No caso do AVC (acidente vascular cerebral), uma das doenças mais debilitantes e principal causa de óbito do mundo, o tempo é realmente o compositor de destinos, como bem diz o poeta Caetano Veloso.

Não é necessário apenas reconhecermos os sintomas do AVC em tempo hábil para controlar as suas consequências no organismo, mas optar pelo tratamento adequado o mais breve possível para evitar as sequelas na vida do paciente. Estamos falando de uma alteração súbita no fluxo sanguíneo no cérebro que leva à morte de 2 milhões de neurônios por minuto, condição grave que pode resultar no entupimento da artéria e consequente falta de circulação na região (AVC Isquêmico) ou na ruptura de um vaso (AVC hemorrágico). 

Apesar de existirem campanhas de conscientização do AVC, não podemos deixar de mencioná-lo com insistência. Somente no mês de julho de 2022, o AVC matou 8.758 brasileiros, o equivalente a 11 óbitos por hora, segunda dados do Portal de Transparência dos Cartórios de Registro Civil no Brasil. Os dados do semestre também são assustadores. Foram 56.320 mortes provocas por AVC, número acima das vítimas de infarto (52.665) e covid-19 (48.865).

O governo anunciou recentemente que fará a incorporação de uma tecnologia para tratar o AVC isquêmico (AVCi), tipo mais frequente dessa doença, que, com o recuo da pandemia de Covid-19, voltou a ser a principal causa de morte no país. Em tempos atuais, uma boa notícia como essa precisa ser anunciada aos quatro cantos. 

Minimamente invasiva, a trombectomia mecânica (TM) complementa a trombólise, única opção até então disponível na rede pública de saúde, e nem sempre eficiente para os casos mais graves do AVCi. Além de segura e eficaz, uma das grandes vantagens da TM é que pode ser utilizada até 24 horas após os primeiros sintomas do AVC com sucesso, enquanto outras formas de tratamentos têm uma janela restrita de indicação e sucesso de apenas a 4,5 horas depois das manifestações iniciais da doença. 

Estamos falando de uma conquista de valor inquestionável, afinal sabe-se hoje que apenas 30% dos pacientes procuram as instituições de saúde no período de até 8h após o início dos sintomas do AVC.

Como mencionado, a identificação dos sintomas do AVC depende da observação e atenção de terceiros, justamente porque nem sempre o paciente percebe o que está acontecendo. Entre os sinais desta doença, observamos a perda da força muscular ou formigamento nos braços, ou pernas, principalmente de um lado do corpo, assimetria facial, dificuldade de fala, dificuldade da visão, desequilíbrio, além de fortes dores de cabeça de início súbito. Qualquer destes sintomas isoladamente ou em conjunto podem ser um AVC e o paciente tem que ser imediatamente direcionado para um centro de AVC.

O país conta com 88 centros especializados no tratamento do AVC habilitados pelo Ministério da Saúde, mas nem todos tem a estrutura e a equipe necessária para a realização da trombectomia mecânica. Ela será introduzida aos poucos nos hospitais já estruturados, já que é necessário treinamento, qualificação técnica de profissionais habilitados, além da disponibilidade de hemodinâmica no hospital. Aprovada em dezembro de 2021, mas ainda não disponibilizada pelo SUS, a trombectomia mecânica consiste na desobstrução da artéria cerebral realizada por um cateter que leva um dispositivo endovascular, um stent ou um sistema de aspiração, para remover o coágulo sanguíneo do cérebro.

 Mudar o cenário do AVC está em nossas mãos. O caminho é estimular a educação da sociedade. Vamos aprender mais sobre essa doença para vencê-la. 

*Sheila Martins é médica neurologista, presidente da World Stroke Organization (WSO), organização internacional que busca reduzir o impacto global do AVC, e da Rede Brasil AVC.

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