Instituto resgata a identidade de pacientes com tecnologia 3D

O Instituto Mais Identidade tem se destacado como referência nacional na recuperação física, social e emocional de pacientes mutilados. Sediado em São Paulo e em atividade desde 2015, a organização sem fins lucrativos atua na reabilitação bucomaxilofacial de pessoas com deformidades faciais e maxilares causadas por cânceres, traumas ou doenças congênitas.

Mais de 200 pacientes de todo o Brasil já foram atendidos gratuitamente pelo Instituto, que utiliza uma tecnologia de impressão 3D de ponta para reestabelecer a aparência e resgatar a identidade dessas pessoas. Somente no ano passado, a equipe multidisciplinar, composta por cirurgiões-dentistas, médicos, psicólogos, fisioterapeutas, assistentes sociais, designers e protéticos, realizou cerca de 1,6 mil atendimentos.

Para receber esses casos, que são de alta complexidade, o Mais Identidade conta com um laboratório digital e uma clínica. Lá, impressoras 3D são utilizadas para esculpir próteses a partir de modelos obtidos com fotografias de smartphones – isso possibilita que pacientes distantes da sede também possam ser atendidos. Até o momento, quase cem pacientes passaram pela reabilitação com cirurgias e próteses, além do cuidado psicossocial. O antes e depois dos pacientes impressiona, já que as peças, esculpidas de maneira quase artesanal, parecem partes reais do corpo.

Como reconhecimento, o Instituto foi o grande vencedor do prêmio Merula Steagall durante a 11ª edição do Congresso Todos Juntos Contra o Câncer, realizado em setembro deste ano. O evento é um dos mais importantes na área de oncologia e reúne mais de 300 organizações dedicadas a todas as áreas da prevenção, tratamento e reabilitação do câncer, reconhecendo experiências significativas na atenção aos pacientes. Inclusive, o Instituto também foi coroado na categoria “Cuidado ao Paciente”, sendo o vitorioso entre mais de 70 projetos que foram apresentados para análise.

A Universidade Paulista (UNIP) é a incubadora do projeto e sedia as instalações do Instituto no campus Indianópolis, localizado na Zona Sul da capital paulista. Fruto de mais de 30 anos de pesquisa, o Mais Identidade conta com o apoio de pessoas, empresas e entidades parceiras, a exemplo do Instituto Bourbon, Neo Alumínio e do Programa Nacional de Apoio à Atenção da Saúde da Pessoa com Deficiência (PRONAS).

Exemplos de superação 

Alaide demorou quatro décadas para conseguir recuperar sua identidade

A professora aposentada Alaide Maria Mussato Forato, 76, descobriu um câncer no rosto aos 36 anos, por conta de uma espinha que nunca cicatrizava. A primeira cirurgia, realizada em 1984, não tratou o tumor pela raiz. Ela não foi submetida a sessões de quimioterapia e nem de radioterapia.

Depois de quase quatro décadas de tratamento, um novo tumor – desta vez interno – surgiu no ano passado, crescendo a ponto de comprometer a meninge. Depois de uma cirurgia delicada que durou mais de oito horas, 25 sessões de quimioterapia e radioterapia, ela sobreviveu, mas, com sequelas ainda mais extensas. Teve que aprender a conviver com a dor. “Não tem analgésico que passe”, comenta.

Apesar de tudo, Alaide nunca desistiu de tocar a vida. Moradora de Amparo, no interior de São Paulo, recorreu a reabilitação para seguir em frente. “Continuo fazendo todas as minhas atividades normalmente. O dom da vida não pode ser desperdiçado”, defende. Ao longo de quase quatro décadas de tratamento, ela já usou diversas próteses, à medida que o material de silicone sofria desgastes naturais com o tempo, a estética do rosto mudava, ou que novas cirurgias ocorriam.

Nunca abandonei o tratamento de reabilitação facial. As próteses me devolveram a dignidade. É muito desagradável andar com curativos no rosto, ainda mais no meu caso que a extensão da cavidade é grande. Essa última, realizada no Instituto Mais Identidade, utilizando tecnologia digital, é tão bem feita que parece a pele da gente”, elogia a paciente.

Fábio buscou tratamento no Instituto ao se lembrar de uma reportagem na TV

O assistente social baiano Fabio Eça de Oliveira, 46, já estava em tratamento oncológico quando assistiu uma reportagem sobre o Instituto em rede nacional. Ele, que teve o primeiro diagnóstico de câncer aos 20 anos, enfrentou quatro recidivas. Na última, a doença voltou em forma de um tumor no maxilar esquerdo. Saiu vivo da mesa de cirurgia, porém com a visão monocular. “O médico explicou que, por precaução, tinha sido melhor retirar as margens e acabei perdendo o olho esquerdo. Foi muito sofrido conseguir aceitar e me entender… Só sabe o quanto é difícil, quem tem um olho só. Mas, pelo menos, fiquei vivo”, conta.

As limitações decorrentes do trauma de ter que passar a viver sem um órgão tão vital, as dificuldades de seguir com o campo visual reduzido, os conflitos com o espelho, não eram os maiores motivos de abalo. “Pior era ter que encarar a sociedade. As pessoas te olham com expressão de estranhamento, olhar de preconceito”, resume o paciente que é natural de Apuarema, a 340 km de Salvador.

Acostumado a orientar pacientes a buscarem tratamento médico e outros direitos, Fábio embarcou para a capital baiana a procura de instituições de referência que pudessem auxiliar na sua reabilitação. “No Aristides Maltez, alegaram que não havia recursos para tratamento com essa complexidade. Na UFBA, também encontrei portas fechadas. Entrei em uma lista de espera sem expectativa alguma de ser chamado”, relembra.

Depois de tantas negativas, ele se lembrou da reportagem que viu na TV. Com uma pesquisa rápida na internet, ele encontrou o site do Instituto Mais Identidade. “Escrevi um e-mail, segui o passo a passo do site e tive resposta em uma semana. Não acreditei quando fui chamado!”, lembra com entusiasmo.

Não tardou para que embarcasse para São Paulo rumo à primeira consulta de avaliação. Três meses depois, já estava com a prótese. “Minha vida melhorou 100%. Recuperei autoestima, voltei a sonhar… Enquanto eu peregrinava aqui na Bahia, e estava sendo atendido por alguns médicos, eu me sentia como um carro velho em uma oficina. No Instituto Mais Identidade, eu me senti que me olharam como um ser humano. Todo atendimento foi gratuito e muito humanizado”, reconhece.

Trabalho do Instituto devolve a autoestima depois do trauma 

Mais de 30 mil novos casos de câncer na região da boca e face são estimados por ano, de acordo com dados do Instituto Nacional do Câncer (INCA). Alguns casos têm cura, outros podem evoluir para mutilações graves que comprometem a fala, alimentação e abalam profundamente e autoestima de quem sobrevive à doença.

A desfiguração facial é sempre devastadora. O rosto é nosso cartão de visita para o mundo, expressa personalidade, comunica ideias. “A gente acolhe no Instituto pacientes que não conseguiam sequer se olhar no espelho. Sobreviveram ao câncer, ao acidente, ao trauma, mas estavam com a vida pausada. Quando recebem a prótese, voltam a viver com plenitude”, destaca o cirurgião-dentista Luciano Dib, um dos fundadores e presidente voluntário do Instituto Mais Identidade.

O trabalho do Instituto é resgatar vidas, identidades. A equipe multidisciplinar que abraçou essa missão está fazendo história. O projeto se tornou referência e atrai estudantes de mestrado e doutorado de várias partes do mundo interessados na tecnologia e metodologia exclusiva associada a complexos procedimentos cirúrgicos e protéticos. “Nosso Método +ID revolucionou a forma de produzir próteses faciais, reduzindo tempo e custo de fabricação, criando modelos digitais por meio de escaneamentos de fotos obtidas por um telefone celular”, destaca Rodrigo Salazar, especialista em Reabilitação e Tecnologia do Instituto Mais Identidade.

Cada prótese realizada com a tecnologia 3D resgata não só a estética, como também a identidade e autoestima para seguir a vida de cabeça erguida. Assim como Fábio, pacientes de outros estados já foram contemplados. Em 2021, como apoio do programa Voa, da Ambev, o Instituto Mais Identidade teve recurso para viabilizar 10 atendimentos no Rio Grande do Norte. Atualmente, 300 pacientes aguardam na esperança de poder se olhar de novo no espelho. “Para aumentar nossa capacidade de atendimento novos apoiadores e parceiros são sempre bem-vindos e necessários”, conclui Dib.

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