Saúde privada: a bomba vai explodir?

Para quem paga um plano de saúde, sejam pessoas ou empresas, a bomba está tiquetaqueando. Todo mês dói. Na renovação, o reajuste é um tormento. A relevância do segmento é inquestionável. Segundo dados da FenaSaúde, publicados em Junho de 2023, a saúde suplementar responde por 2.7% do PIB brasileiro, pela geração de 4.8 milhões de empregos e atende 50.8 milhões de usuários. Relevante por um lado. Desafiador por outro.

Em um cenário em que os custos da saúde evoluem, consistentemente, a uma taxa bastante superior à inflação, parece razoável questionar a sustentabilidade dos setor. Entre 2016 e 2023, o índice de VCMH*, variação do custo médico hospitalar e indicador que traduz a evolução das despesas em saúde, esteve, em média, 9.3 pontos percentuais acima do IPCA, índice de preços ao consumidor amplo.

O período citado ainda contempla e é amortecido pelo atípico ano de 2022, em que o VCMH, índice que considera além do incremento dos preços a frequência de uso, sofreu importante queda. Isso se deu por conta da pandemia de Covid-19 que fez com que os pacientes postergassem os procedimentos eletivos e, portanto, houve um choque, para baixo, de demanda, fruto da redução de frequência.

O descasamento entre os custos de saúde e a evolução dos preços gerais da economia é um evento global e persistente no tempo. Dessa forma, a pergunta ecoa: até quando as pessoas, especialmente as empresas que hoje representam mais de 70% dos usuários cobertos pela saúde privada, irão sustentar esse pagamento? A resposta: já não sustentam.

Segundo dados disponibilizados pela ANS, Agência Nacional de Saúde Suplementar, entre 2018 e 2023, os reajustes anunciados pelas operadoras de saúde para os contratos coletivos empresariais somaram 61.7%. Todavia, o ticket médio, ou seja, o valor total de prêmio pago dividido pelo número de usuários, passou, no mesmo período, de R$ 339,58 para R$ 454,26. Isso é traduzido em um aumento de 33.8%, apenas 1 ponto percentual acima do IPCA, acumulado no mesmo intervalo de tempo, que foi de 32.8%.

Em suma, foi proposto às empresas um reajuste de 61,7% mas só absorveram 33.8%. Fizeram isso, especialmente, a partir de downgrade de produto: aplicação de fatores moderadores, como a coparticipação; diminuição de abrangência, saem planos nacionais e entram regionais; e, por fim, mudança do tipo de acomodação, de quarto privativo para enfermaria. Outra estratégia utilizada é a migração oportunista face ao dumping praticado.

O mercado é bilionário e altamente regulado, nesse contexto, é possível que nunca tenhamos uma ruptura. Ou seja, parece que não será uma bomba atômica, mas uma série de pequenas e pontuais explosões que, no médio prazo, vão reformar o sistema. As primeiras já explodiram.

*Para fins do presente material, considerou-se o VCMH publicado pelo IESS, Instituto de Estudos de Saúde Suplementar.

Felipe Baeta, CEO da Piwi.

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