Startup cria método para testar cosméticos e medicamentos sem utilizar animais como cobaias

Um laboratório com sede no ecossistema de biotecnologia de Botucatu, interior de São Paulo, está colocando o Brasil no mapa-múndi das empresas que realizam testes de medicamentos, cosméticos e desinfetantes sem o uso de animais como cobaias. Com vantagens éticas, sociais e econômicas imbatíveis: segurança, eficácia, menos custos e impulso ao desenvolvimento e difusão de inovações que promovem saúde e bem-estar.

Trata-se do laboratório Crop, um dos 60 que compõem a criteriosa Rede Brasileira de Laboratórios Analíticos em Saúde (Reblas), da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). A homologação da Reblas é uma conquista que marca a trajetória da empresa criada em 2020, e que em 2021, iniciou as operações.

Em menos de dois anos, além do ingresso na Reblas, a Crop Labs desenvolveu métodos de testes que têm atendido empresas nacionais e internacionais, inclusive as pioneiras no segmento de terapia com células tronco, para as quais os métodos de teste de segurança do laboratório possibilitaram a validação de seus produtos. Ainda, foi contemplada com aportes de investidores (da ordem de R$ 2.5 milhões), se destacou nas pesquisas contra o vírus causador da covid-19 e incorporou seu portfólio a marcas importantes da indústria química, farmacêutica e de higiene pessoal.

Método

Mas, quais métodos alternativos da Crop Biolabs são esses? Um dos fundadores e diretor do empreendimento, o biotecnologista Aruã Prudenciatti explica: mimetiza-se o corpo humano, utilizando uma célula de algum órgão – como fígado ou rim. Em vitro, expande-se essa célula, criando-se um “mini órgão”. “Ou seja, trata-se de cultivar célula humana em laboratório, em proveta”, sublinha o diretor da empresa.

Conceito: fim ao sacrifício de animais

O cientista empreendedor cita, por exemplo, que testes em camundongos, quando não bem sucedidos, representam a morte da maioria dos indivíduos envolvidos. Com essa substituição, tem-se mais eficácia, segurança e, principalmente, responsabilidade ética. Ademais, frisa Aruã, os métodos alternativos reduzem o custo das pesquisas.

Aruã Prudenciatti

O diretor da Crop Biolabs assinala ainda que existem críticas éticas e técnicas para o uso de animais em pesquisa. O pesquisador se referencia no filósofo norte-americano Charles R. Magel, “que retratou a contradição lógica dos testes em animais com o seguinte raciocínio: ‘Pergunte aos experimentadores por que eles realizam experimentos em animais, e a resposta é: ‘Porque os animais são como nós’. Pergunte aos experimentadores por que é moralmente aceitável experimentar em animais, e a resposta é: ‘Porque os animais não são como nós'”.

Para além das críticas éticas, “que já são pertinentes”, conforme frisa Aruã, há as críticas de ordem técnica. “Segundo um relatório da empresa Deloitte, o custo para desenvolvimento de um novo medicamento foi da ordem de bilhões de dólares em 2022. Apesar desses altos investimentos, o mesmo relatório destaca que 90% desses novos produtos, mesmo aprovados nos testes de segurança e eficácia em animais, não obtiveram aprovação nos ensaios clínicos em seres humanos”, menciona.

Na avaliação do cientista empreendedor, trata-se de uma constatação “que respalda o reconhecimento crescente na comunidade científica global de que os animais não constituem o modelo de pesquisa mais adequado para replicar os processos do corpo humano”. Métodos de teste mais acurados, e eticamente responsáveis, aumentam as perspectivas de aprovação na etapa clínica das pesquisas. Isso reduz custos associados à inovação em saúde, “e permite que mais produtos alcancem as pessoas, pela viabilização de mais investimentos”.

O pesquisador informa que, de modo a dar um novo passo em direção a testes éticos, sem uso de animais, e de resultados mais efetivos, a Crop Biolabs tem desenvolvido órgãos em chip. “São, como o nome indica, dispositivos em escala micro, que replicam a estrutura e função de órgãos humanos, permitindo a realização de experimentos controlados. O método é mais representativo às respostas fisiológicas humanas do que os modelos tradicionais”, descreve. “Aliar metodologias que representem a fisiologia humana em vitro com métodos analíticos de precisão evita testes extensos, custos e demorados”, acrescenta o diretor científico da Crop Biolabs, doutor Lucas Ribeiro.

Experize

Tornar a ciência, tecnologia, pesquisa e desenvolvimento mais atraentes, e, como consequência, promover bem-estar e evolução da sociedade, está entre os princípios que movem Aruã Prudenciatti, doutor Lucas Ribeiro e o quadro de colaboradores. “No mundo, já existe uma negatividade, uma rejeição, a testes em animais. No Brasil, isso começa a ocorrer também – tanto que, no desenvolvimento de cosméticos, não pode mais”, afirma.

Aruã, que realizava pesquisas na universidade de Luisiana nos Estados Unidos, com testes de novos candidatos a medicamentos. e o amigo Lucas Ribeiro, pesquisador trabalhando com infecções virais de Zika vírus e Dengue antes da pandemia da Covid-19 do campus da Universidade Estadual Paulista (Unesp) em Botucatu, decidiram então, constituir a Crop Biolabs, há três anos. Eles constatavam, na ocasião, que a indústria brasileira precisava recorrer a laboratórios dos Estados Unidos, Europa e China para o desenvolvimento de pesquisas em métodos alternativos. Com a Crop Biolabs, o Brasil passa a proporcionar a expansão desse mercado, internamente.

EUA

Por conta do método que vem aplicando, a Crop Biolabs foi convidada para uma residência no Estados Unidos (Nova Iorque), para ampliação de sua atividade comercial da região em um programa da Confederação Nacional da Indústria (CNI) e do Serviço Brasileiro de Apoio às Micros e Pequenas Empresas (Sebrae). A empresa também compôs a delegação brasileira na BIO em Boston, maior feira de biotecnologia do mundo, onde pôde apresentar suas soluções para investidores internacionais.

A Crop se destacou também durante a pandemia de Covid-19 por ser o primeiro laboratório brasileiro privado a isolar o vírus para testes de eficácia de medicamentos e produtos químicos, em parceria com o Laboratório de Biotecnologia Aplicada do Hospital das Clínicas da UNESP, de Botucatu. “A realização de estudos de eficácia em virologia no Brasil foi algo que permitiu que empresas nacionais se posicionassem globalmente no combate ao vírus, além de ter representado um novo mercado para nossa organização”, destaca Aruã Prudenciatt

Atualmente, o portfólio de clientes estão assim divido: 40% da indústria de higiene pessoal, na que se incluem fabricantes de cosméticos; 35% a indústria química; e 25% da indústria farmacêutica.

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