Falar de saúde mental no trabalho é quase inevitável — e pessoal. Além disso, a nova norma exige que empresas incluam riscos psicossociais na gestão de saúde e segurança do trabalho. Para além da legislação, o desafio é criar culturas organizacionais mais humanas e acolhedoras.
Esse tema atravessa a minha trajetória profissional de forma muito concreta. Já vi de perto como a falta de acolhimento pode afetar pessoas incríveis. Em uma empresa onde atuei, tive um colaborador brilhante que passou por um caso severo de burnout. Mesmo tendo pouca experiência na época sobre como lidar, fiz o possível para apoiá-lo: redistribuí tarefas, assumi viagens em seu lugar, ofereci escuta, dei espaço. Mas, no fundo, nós dois sabíamos que não havia um apoio institucional. Havia medo. Medo de julgamento, de parecer frágil. E isso não deveria acontecer.
É por isso que vejo com esperança a atualização da Norma Regulamentadora nº 1 — a NR-1 — publicada pelo Ministério do Trabalho e Emprego. A nova redação, que entra em vigor em maio de 2025, exige que empresas incorporem riscos psicossociais — como estresse ocupacional, assédio moral e sobrecarga emocional — em seus Programas de Gerenciamento de Riscos, os PGRs.
A nova redação da NR-1 deixa claro que as empresas precisam gerenciar de forma integrada todos os tipos de riscos sobre saúde e segurança no trabalho. No dia a dia, as companhias já eram obrigadas a controlar os riscos físicos, como ruídos ou temperaturas extremas, com medidas como isolamento acústico e climatização do ambiente; os riscos químicos com cuidados no manuseio, ventilação adequada e uso de equipamentos de proteção; e os riscos ergonômicos, como postura inadequada ou esforço repetitivo com ajustes nos postos de trabalho e incentivo a pausas regulares. Agora chegou a vez dos riscos psicossociais.
Na prática, espera-se que as empresas adotem uma abordagem mais humanizada e focada no bem-estar integral de seus colaboradores para promover um ambiente de trabalho equilibrado e acolhedor, por exemplo, investindo em plataformas de bem-estar físico e mental, para a construção e manutenção de hábitos saudáveis.
Além disso, a expectativa é de que as companhias passem a implementar políticas de bem-estar, criar canais de comunicação para que os trabalhadores possam relatar suas dificuldades emocionais e promover equilíbrio entre as demandas profissionais e, neste caso, as limitações pessoais são essenciais para mitigar a crise de saúde mental. Não podemos esquecer das campanhas de conscientização sobre saúde mental, já que essas agendas desempenham um papel crucial na quebra de estigmas e na construção de um ambiente mais saudável e produtivo.
A norma não trata apenas do cumprimento legal — ela propõe uma mudança de paradigma, em que a saúde mental passa a ser vista como parte essencial da integridade do trabalhador. Essa inclusão reforça o dever das organizações de promover um ambiente de trabalho mais seguro, saudável e respeitoso em todos os aspectos, inclusive emocionais.
Segundo dados do Ministério da Previdência Social, mais de 3,5 milhões de licenças médicas foram solicitadas ao INSS em 2023. Destas, 472 mil foram por transtornos mentais — um aumento de 68% em relação ao ano anterior. A realidade está escancarada: o sofrimento psíquico já faz parte do cotidiano de milhões de trabalhadores.
Mas aplicar uma norma não basta. Empresas que integram saúde mental à sua cultura colhem frutos mais sustentáveis: menos turnover, mais engajamento, melhor clima e maior produtividade. Ferramentas de apoio, plataformas de bem-estar e programas estruturados ajudam — mas a mudança começa nas conversas, nas lideranças e nas decisões do dia a dia.
Essa nova NR-1 é, acima de tudo, um convite à coragem: a coragem de olhar para dentro, rever práticas e colocar as pessoas no centro. Porque quem cuida de gente, cresce com elas.
Vivian Muniz, Vice-Presidente de Produto, Marketing e Customer Service na Fully Ecosystem.