17
A digitalização da saúde avançou muito nos últimos anos — mas agora entramos em um novo capítulo. A chegada da Inteligência Artificial Generativa aos bastidores da operação hospitalar marca uma virada importante. Estamos falando de decisões mais rápidas, análises em tempo real e uma capacidade inédita de prever, recomendar e agir com base em dados — tudo isso em linguagem simples, acessível e diretamente conectada à rotina de quem está na linha de frente da gestão.
E essa virada já está em curso. Os chamados agentes generativos — sistemas que combinam modelos de linguagem com dados operacionais para interpretar contextos, sugerir ações e executar tarefas — vêm ganhando espaço dentro das instituições. Mais do que automatizar processos, eles mudam a forma como se trabalha. Reduzem erros, eliminam tarefas repetitivas e liberam tempo das equipes para que foquem no que realmente importa: pensar, decidir, cuidar.
Dois dos campos em que essa transformação é mais visível e urgente são o ciclo da receita e a cadeia de suprimentos. Ambos concentram parte significativa dos custos, da complexidade operacional e dos gargalos financeiros do sistema de saúde. E ambos dependem, historicamente, de decisões que exigem muita precisão, mas que ainda são feitas com apoio limitado de dados organizados e acionáveis.
No ciclo da receita, a IA Generativa atua como um copiloto técnico. Analisa contas médicas, identifica inconsistências, reconhece padrões de glosas e sugere respostas com base em regras normativas, históricos de faturamento e até jurisprudência contratual. Isso acontece em segundos — em um processo que antes exigia horas de revisão humana. A consequência direta é a redução do retrabalho, a melhoria do índice de recebimento e a autonomia para lidar com situações complexas sem depender exclusivamente de áreas jurídicas ou auditorias externas. É receita recuperada com inteligência.
Já na cadeia de suprimentos, a IA vira os holofotes para uma área que historicamente operava às escuras. Em vez de lidar com estoques com base em “feeling”, planilhas desconectadas ou históricos desatualizados, os gestores passam a contar com previsões que levam em conta consumo real, sazonalidade, perfil de atendimento e comportamento de fornecedores. Isso permite antecipar necessidades, reduzir estoques ociosos e fazer compras mais estratégicas. Em um cenário de pressão orçamentária constante, essa previsibilidade se traduz em eficiência operacional — mas também em sustentabilidade financeira.
Essas frentes — receita e suprimentos — não são apenas áreas de suporte. Elas são estratégicas. Movimentam bilhões de reais e impactam diretamente o resultado de cada hospital, clínica, laboratório ou operadora. Quando a IA Generativa é aplicada diretamente nos fluxos de decisão dessas áreas, ela deixa de ser promessa de inovação e passa a ser parte do motor da operação. Invisível, sim — mas essencial.
No Brasil, o setor da saúde movimenta cerca de R$ 800 bilhões por ano, sendo R$ 260 bilhões apenas na saúde suplementar, segundo dados do IESS e do IBGE. Nesse contexto, plataformas digitais como as da Bionexo, por exemplo, conectam mais de 4 mil hospitais a 37 mil fornecedores, transacionando mais de R$ 40 bilhões anualmente. Com a IA Generativa embarcada nessas soluções, conseguimos aumentar em até 80% a eficiência de fluxos logísticos e administrativos, segundo nossos benchmarks com clientes de diferentes portes e regiões.
E esses ganhos não ficam no discurso. Um gestor de planejamento pode, por exemplo, receber alertas automáticos sobre ruptura de itens essenciais e ser orientado sobre alternativas viáveis em tempo real. Um analista de faturamento pode processar contas com mais assertividade, recusar glosas com base técnica e ganhar autonomia sem abrir mão da segurança. São decisões mais rápidas, menos esforço manual, e mais tempo dedicado ao que realmente faz diferença: cuidar das pessoas e fazer a operação rodar com excelência.
Esse movimento é parte de uma tendência global. O relatório da PwC mostra que 63% dos hospitais privados no Brasil já usam algum tipo de solução de IA na operação. Operadoras, laboratórios e farmacêuticas também têm avançado — seja para detectar fraudes, acelerar triagens, prever demanda ou personalizar tratamentos. A McKinsey estima que, até 2030, a IA pode gerar até US$ 360 bilhões em economia anual para o setor. No Brasil, 58% dos executivos da saúde já identificam ganhos de eficiência com IA Generativa e 35% relatam aumento de receita com sua adoção, segundo a 28ª CEO Survey da PwC.
Mas nenhuma tecnologia avança sozinha. Para que essa transformação seja sustentável, é fundamental garantir segurança, ética e transparência. O Projeto de Lei nº 2.338/2023, que propõe um marco legal para o uso responsável da IA no Brasil, aponta nesse caminho. E iniciativas como o open health, voltadas à interoperabilidade entre sistemas, reforçam a importância de trabalhar com dados consistentes, compartilháveis e livres de viés.
A verdade é que a jornada da IA Generativa na saúde está só começando. Mas o que já está claro é que essa tecnologia — quando aplicada com propósito, responsabilidade e foco no impacto real — tem tudo para se tornar uma aliada indispensável da gestão hospitalar moderna. Porque no fim do dia, a saúde continua sendo sobre pessoas. E toda tecnologia que ajuda a cuidar melhor, com mais eficiência e mais humanidade, merece estar no centro da estratégia.
Ubirajara Maia, Vice-presidente de Tecnologia e Produto da Bionexo.