As soluções de tecnologia da informação para os serviços na saúde pública avançaram com a pandemia, mas o espaço para crescimento ainda é grande e já pode ser percebido pela quantidade de editais de licitações “Especialmente no período agudo da pandemia de Covid-19, a saúde digital foi potencializada e não só na rede pública”, observa o diretor de saúde pública da MV, Vandré Dall’Agnol. “É possível observar a aceleração no interesse dos gestores em superar tradicionais barreiras à informatização, mais culturais do que tecnológicas. A partir de 2020, começou-se a falar muito mais de investimento nesta área”.
Mas, na opinião dele, ainda há um longo caminho a seguir, pois uma parcela de 3% dos estabelecimentos públicos ainda não possuem computadores, embora tenha havido um avanço de três pontos percentuais sobre o ano anterior, conforme a mais recente pesquisa TIC Saúde, realizada pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br).
Restringindo essa análise apenas ao grupo das Unidades Básicas de Saúde (UBS), em números absolutos, 1,3 mil unidades operam sem computadores e internet. “Naturalmente, esse é um pequeno resquício de estabelecimentos desassistidos de digitalização em um universo de 43 mil UBS. No entanto, o ponto de atenção está na proporção da sociedade impactada por esse cenário, bem como dos desafios desnecessários enfrentados pelos profissionais da saúde, considerando o atual estágio de maturidade digital do próprio país”, observa Dall´Agnol.
Outro dado da pesquisa que ajuda a visualizar em que nível a saúde digital está no âmbito público diz respeito à segurança da informação. Atualmente, 25% dos estabelecimentos públicos possuem uma política para se adequar a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), ante uma fatia de 50% na esfera privada.
A telessaúde — atividade regulamentada recentemente pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), em maio de 2022 — está ganhando terreno na saúde pública. Segundo a pesquisa TIC Saúde, 15% dos estabelecimentos já oferecem serviços de teleconsulta e 17% fazem monitoramento remoto de pacientes. Outra parcela um pouco maior, de 24%, fornece educação de saúde a distância. Trata-se de uma boa notícia, considerando que este recurso passou a ser fomentado recentemente.
O que esperar do futuro?
“A saúde digital no campo público vai crescer gigantescamente”, projeta Dall´Agnol, com base no desempenho dos próprios clientes da MV, localizados em mais de 200 municípios. “Neste ano, tivemos um aumento de mais de 100% no lançamento de editais com o objeto voltado para soluções tecnológicas em saúde digital”. “Percebemos que municípios muito pequenos, abaixo de 20 mil habitantes e que não estavam tão preocupados com essa pauta, passaram a pedir informações com a chegada da pandemia e estão buscando um pouco mais do que as ferramentas que o SUS fornece. Eu não vejo, daqui para a frente, um município que não esteja informatizado. O potencial de crescimento de diversas aplicações, especialmente do prontuário eletrônico do paciente (PEP) é muito grande no setor público.”
A tendência, na visão do executivo, é haver cada vez mais exemplos como o da cidade paulista de Votuporanga, que se tornou o primeiro município brasileiro 100% conectado. Um importante aliado para isso será a aguardada expansão do 5G, que fortalecerá a conectividade, especialmente nas regiões mais afastadas dos grandes centros e nas áreas rurais.
Outro ponto salientado por Dall´Agnol é que o próprio gestor público está mudando a sua postura, muito pelo fato de que o município é remunerado por sua produção e, também, para se evitar custos desnecessários. Como exemplo, sabemos que um determinado exame pode ter uma validade de até, ou superior a seis meses. Mas, é muito comum um mesmo paciente repetir esse exame em outra unidade de saúde em um período bem menor. Os gestores estão mais preocupados com as contas públicas e estão começando a se profissionalizar neste sentido. É possível observar a aceleração no interesse dos gestores em superar tradicionais barreiras à digitalização, mais culturais do que tecnológicas”, explica.
Dall´Agnol destaca que a saúde digital empodera o cidadão e que isso também é um fator de fomento à digitalização. “Antes, ele precisava sair da sua casa, ir até uma UBS, pegar uma senha e esperar horas para agendar uma consulta. Agora, pelo celular, ele agenda automaticamente e só sai de casa para fazer o procedimento que precisa. Consegue, inclusive, acompanhar a sua fila pelo aplicativo”, ilustra o executivo.
Nessa projeção, é preciso considerar como forte fator de contribuição a própria digitalização do governo, que vem avançando, por meio do chamado governo digital (e-gov), mecanismo que visa evoluir, continuamente, os processos e a prestação de serviços públicos com o auxílio das tecnologias da informação e comunicações (TICs). Daí, deriva-se o próprio Conecte SUS, plataforma de saúde para o cidadão, profissionais e gestores de saúde.
Barreiras a superar
Para o executivo da MV, há duas grandes barreiras para um município adotar uma saúde verdadeiramente digital. A primeira é a infraestrutura, por haver uma diversidade grande entre as mais de cinco mil cidades brasileiras. Afinal, há municípios que estão mais adiantados, mas há muitos que carecem de mais investimentos nessa área. “A segunda barreira é cultural, no sentido de o gestor público reconhecer o valor da tecnologia e que esse é um caminho sem volta”, defende Dall´Agnol. “Além disso, o digital confere o permanente registro, monitoramento e transparência das informações, e isso pode ser encarado como uma perda de liberdade”.