Dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) revelam que, entre 2023 e 2024, os pedidos de indenização por danos morais e materiais relacionados a erros médicos – tanto na rede pública quanto na privada – aumentaram 64,1%. O número de processos saltou de 45.687 para 74.970 somente em um ano, com casos graves envolvendo procedimentos estéticos mal executados.
Incidentes relacionados ao uso inadequado de substâncias como o polimetilmetacrilato (PMMA) — comumente aplicado em harmonização facial e redução de gordura localizada (e glútea) — têm se multiplicado pelo país, como os ocorridos na clínica Ame-se, em Goiânia, e na Bodyplastia, em Pernambuco, onde pacientes também sofreram com sequelas graves devido à falta de protocolos seguros.
“Complicações como infecções, reações alérgicas a anestésicos e resultados desastrosos são frequentes em ambientes que negligenciam as normas básicas de segurança”, adverte Gisele Siqueira, esteticista, cosmetóloga e especialista de equipamentos da Eh Medical.
O conceito de biossegurança vai além da higienização dos instrumentos: é um sistema integrado de práticas e protocolos destinados a prevenir infecções, acidentes e complicações durante e após procedimentos estéticos. Seu principal objetivo é criar uma barreira eficaz contra ameaças biológicas (como vírus e bactérias), químicas (produtos tóxicos) e físicas (instrumentos cortantes). Essa proteção é mais do que um requisito técnico, ela representa um compromisso ético com a saúde de pacientes e profissionais.
A eficácia dessas medidas está em detalhes que, embora muitas vezes imperceptíveis, fazem toda a diferença. Um exemplo é a lavagem correta das mãos, que reduz em até 80% o risco de contaminação cruzada, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). Outro protocolo importante é a esterilização de instrumentos em autoclave — processo que utiliza vapor de água em alta pressão e temperatura para eliminar 99,9% dos microrganismos —, conforme regulamentação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Essa etapa é crucial para evitar infecções potencialmente fatais, como septicemia e gangrena.
Porém, a verdadeira prevenção começa antes mesmo do procedimento. Segundo Gisele, uma anamnese detalhada, que investigue histórico médico, alergias e condições específicas do paciente, pode prevenir a maioria das reações adversas, sendo tão relevante quanto o domínio técnico. “A abordagem preventiva, quando realizada de forma sistemática e abrangente, permite identificar riscos potenciais e implementar estratégias personalizadas para cada paciente, reduzindo significativamente a ocorrência de complicações”, afirma.
Equipamentos de proteção individual (EPIs), frequentemente subestimados, funcionam como escudos: luvas previnem o contato com fluidos corporais, máscaras filtram aerossóis infecciosos e óculos protegem contra respingos perigosos. Já o descarte adequado de resíduos completa o ciclo de proteção, evitando que materiais contaminados se tornem focos de infecção para a comunidade.
Enquanto a demanda por procedimentos estéticos cresce, esses relatos servem como um alerta: a busca pela estética nunca deve se sobrepor à segurança. “Cabe aos profissionais adotar melhores práticas seguindo as normas estabelecidas pela Anvisa e, aos pacientes, exigir clínicas que priorizem sua saúde acima de resultados imediatos”, conclui a esteticista e cosmetóloga.