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Como otimizar a gestão de documentos críticos no setor de Saúde

por Inon Neves
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A saúde lida com alguns dos dados mais sensíveis que existem – informações pessoais de pacientes, históricos clínicos, resultados de exames, protocolos de pesquisa e fórmulas de medicamentos. As organizações de saúde no Brasil hoje navegam por um emaranhado de requisitos: proteger dados pessoais sensíveis, de acordo com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), seguir padrões de qualidade e documentação sanitária, com regulações da Anvisa e de órgãos de classe e, ao mesmo tempo, modernizar processos substituindo o papel por sistemas eletrônicos – tudo isso sem perder a conformidade.

Essa complexidade regulatória crescente eleva a importância da gestão documental estratégica. O não cumprimento de uma obrigação pode implicar multas pesadas, perda de certificações ou mesmo suspensão de atividades. Por outro lado, a adesão a essas normas traz benefícios tangíveis, como maior qualidade assistencial e operacional. Padrões de documentação bem implementados aumentam a segurança do paciente e a qualidade do produto, além de gerar segurança jurídica para as instituições e confiança junto aos pacientes e parceiros.

LGPD: uma mudança radical na classificação dos dados

Nos últimos anos, o arcabouço regulatório para proteger e gerenciar esses dados tornou-se mais rigoroso. A LGPD, em vigor desde 2020, equiparou dados de saúde a dados pessoais sensíveis e exige bases legais sólidas, segurança e transparência no tratamento dessas informações.

As sanções por descumprimento da LGPD incluem multas de até 2% do faturamento – limitadas a R$ 50 milhões por infração, além de possíveis bloqueios de dados e publicidade negativa da infração. Esse potencial punitivo pressiona as organizações de saúde a aprimorar seus controles documentais e de privacidade. Entretanto, pesquisas indicam que muitas instituições ainda correm para se adequar. Segundo a pesquisa TIC Saúde 2023, realizada pelo CGI.br – Comitê Gestor da Internet no Brasil –  apenas cerca de 30% dos estabelecimentos de saúde brasileiros com internet nomearam um encarregado de dados (DPO), e menos de 30% implementou um plano de resposta a incidentes de segurança.

Medidas básicas como disponibilizar canais de atendimento aos titulares de dados também estão aquém do ideal – apenas 28% as empresas mantinham canais para o titular exercer seus direitos em 2023, uma queda em relação a 2021- ainda segundo dados da do estudo realizado pelo CGI.br.

Regulamentações setoriais também crescem

Em âmbito farmacêutico e de dispositivos médicos, a Anvisa igualmente intensificou requisitos de documentação nos últimos anos. A resolução RDC 301/2019 (atualizada pela RDC 658/2022), por exemplo, incorporou diretrizes internacionais de Boas Práticas de Fabricação (BPF) e enfatizou a integridade de dados nas plantas industriais. Seu capítulo de documentação exige controles adequados para garantir a precisão, integridade, disponibilidade e legibilidade de todos os dados. Isso inclui registros de produção, protocolos de qualidade, resultados de validações e outros documentos críticos de fabricação.

A falha em manter documentações fidedignas pode resultar em infrações sanitárias graves – um lote de medicamentos pode ser interditado ou um certificado de boas práticas suspenso se auditorias encontrarem registros inconsistentes ou incompletos.

Da mesma forma, em pesquisa clínica, normas de Boas Práticas Clínicas (BPC/ICH-GCP) e guias da Anvisa requerem que patrocinadores e centros de pesquisa mantenham Trail Master Files e prontuários de estudo organizados, assegurando rastreabilidade de cada dado coletado em estudos com pacientes.

Paralelamente, houve avanços legais para facilitar a digitalização documental no setor. A Lei n.º 13.787/2018, por exemplo, autoriza a digitalização de prontuários médicos e o descarte do papel original, desde que seguidos padrões técnicos rigorosos para garantir integridade, autenticidade e confidencialidade do documento digital. Essa lei exige que a digitalização reproduza todas as informações do original e que os arquivos sejam gerados com certificação digital ICP-Brasil, conferindo-lhes o mesmo valor legal do papel. Após a digitalização auditada por uma comissão de revisão, os originais em papel, salvo dos de valor histórico, podem ser eliminados, o que reduz significativamente a massa de arquivos físicos nos hospitais.

O custo da má gestão documental

Do ponto de vista de governança, os custos da não conformidade documental tendem a superar em muito os investimentos necessários para prevenir problemas. Em termos financeiros, além das multas regulatórias,

há custos legais e operacionais significativos. Hospitais brasileiros já foram condenados a indenizar pacientes por extravio de prontuário ou vazamento de informações – ainda que valores individuais possam ser modestos, a ocorrência de múltiplas ações desse tipo pode elevar rapidamente o passivo.

Mais grave é o impacto de não ter documentação adequada perante uma auditoria ou investigação: uma indústria farmacêutica que não consiga comprovar, via registros, a qualidade de um lote de medicamentos pode enfrentar recolhimento de produtos, desperdício de produção e danos à marca, afetando diretamente receitas futuras. Há também os custos ocultos da má gestão, como ineficiências internas e desperdícios.

Arquivos físicos desorganizados ou sistemas eletrônicos fragmentados levam funcionários a gastarem tempo excessivo procurando informações ou reconfirmando dados. Equipes médicas sem acesso rápido ao histórico do paciente perdem produtividade e podem duplicar exames desnecessariamente.

A má gestão documental pode incorrer em: custos diretos, como multas, indenizações, retrabalho; custos indiretos, relativos à ineficiência, perda de negócios, aumento do prêmio de seguros, entre outros, ou sanções qualitativas, com a restrição operacional, ou o abalo reputacional. Para gestores, esses potenciais prejuízos reforçam a necessidade de tratar a gestão da informação crítica como prioridade estratégica, com investimentos proporcionais ao risco envolvido.

Estratégias para otimização documental

Diante de desafios tão grandes, as organizações de saúde e farmacêuticas vêm adotando estratégias multifrontes para otimizar a gestão de documentos críticos, buscando a transformação digital sem abrir mão da conformidade.

Uma das principais estratégias é a digitalização de documentos, e a redução do papel. Hospitais e clínicas estão implementando projetos de scanning massivo de prontuários e laudos antigos, aproveitando a lei 13.787/2018 que dá base legal para substituir papéis por cópias digitais fiéis. Processos de digitalização seguem protocolos rígidos: equipamentos de alta resolução, verificação de qualidade imagem a imagem e uso de certificados digitais para assinatura dos arquivos, garantindo autenticidade.

Mesmo digitalizando ao máximo, o setor de saúde convive com documentos físicos insubstituíveis, e com repositórios digitais gigantescos. Por isso, uma estratégia mista de custódia segura se faz necessária. Muitos hospitais e laboratórios estão terceirizando a guarda de arquivos físicos para empresas especializadas em gestão documental, que oferecem galpões com controle de temperatura, umidade, proteção contra incêndio e sistemas de segurança 24h.

Essas empresas não apenas armazenam, mas também gerenciam a cadeia de custódia – qualquer retirada ou manuseio de uma caixa de documentos é registrada, e serviços de transporte seguro entregam prontuários físicos mediante solicitação, dentro de SLA acordado.

Isso libera as instituições de manter infraestrutura própria de arquivo morto e garante que o acervo esteja protegido por padrões profissionais. No âmbito digital, a custódia segura se traduz em backups e redundância. As melhores práticas incluem manter backups criptografados em ambientes off-site ou em nuvem com geo-redundância (regiões distintas), protegendo contra perda massiva de dados em caso de desastre local.

Testes periódicos de restauração de backup e uso de storage imutável – que impede que até ransomware delete os arquivos de backup – também são adotados para assegurar que os documentos digitais possam ser recuperados inteiros e íntegros a qualquer momento.

Em suma, no setor farmacêutico a conformidade não deve ser vista apenas como um dever, mas como uma oportunidade de aprimorar processos internos, proteger pacientes e consumidores, e fortalecer a reputação institucional. A gestão de documentos críticos, alinhada às melhores práticas e à legislação vigente, é um investimento estratégico que paga dividendos em forma de resiliência, qualidade e credibilidade para as organizações de saúde no Brasil atual.

Inon Neves, vice-presidente da Access.

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