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Falta de mão de obra desafia setor da saúde, aponta estudo da Deloitte

por Redação
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A pandemia de Covid-19 mudou definitivamente a forma como os cuidados de saúde são prestados no mundo todo, desde a aceleração da adoção de novas tecnologias e modelos de prestação até o aumento do foco em sustentabilidade e equidade em saúde. O estudo “Perspectivas Globais do Setor de Saúde 2023”, elaborado pela consultoria Deloitte, apresenta uma análise sobre o estado atual do setor e explora insights sobre políticas internacionais de saúde, identificando ameaças emergentes à saúde pública e como a tecnologia mudará a prestação de cuidados de saúde na próxima década. O relatório examina cinco áreas-chave que são críticas para essa transformação: prestação de cuidados de saúde digital, transformação digital, equidade em saúde, força de trabalho e sustentabilidade.

“O setor de saúde segue lidando em seu dia a dia com os desafios que a pandemia da Covid-19 trouxe há três anos. As transformações ocorrem a todo o tempo, e o impacto duradouro da pandemia pode ser a oportunidade para que se reinventem os cuidados em saúde, se baseando em tendências pré-existentes, como mudanças nas preferências do consumidor e nos comportamentos dos pacientes, além de tecnologia em rápida evolução, como a telemedicina”, destaca Luís Joaquim, sócio-líder de Life Sciences & Health Care da Deloitte.

Além das cinco áreas apontadas no relatório global Joaquim destaca outros temas, tendências e desafios que impactarão o mercado brasileiro nos próximos meses. Uma delas está relacionada à instabilidade financeira que os players do setor enfrentam no Brasil. O setor de saúde no Brasil está passando por um período de instabilidade financeira, afetando tanto hospitais/prestadores quanto operadoras de planos de saúde. O estudo da Deloitte contempla um cenário pós-Covid; no começo da pandemia, em 2020, houve um declínio no uso dos serviços de saúde e deflação nos custos médicos. Os hospitais sofreram com a diminuição das receitas, pois as pessoas ficaram isoladas e não utilizavam os serviços. Por outro lado, os custos dos insumos médicos aumentaram significativamente, levando muitos hospitais a enfrentarem problemas financeiros. Em contraste, as operadoras de planos de saúde registraram resultados financeiros recordes em 2020. Com as pessoas isoladas em casa, muitos indivíduos deixaram de utilizar seus planos de saúde.

No entanto, a partir de 2021 e com reflexos ainda em 2023, a demanda pelos serviços de saúde aumentou consideravelmente. A busca por serviços médicos foi impulsionada por demandas reprimidas, como cirurgias eletivas, diagnósticos não realizados durante a pandemia e o agravamento de condições crônicas, resultando em quadros clínicos mais complexos. Muitas pessoas perceberam a importância de possuir um plano de saúde durante a pandemia, resultando em um aumento de aproximadamente 3,5 milhões de usuários desde 2020. Aqueles que ingressam no sistema de saúde sem um plano trazem consigo uma demanda reprimida. “Portanto, quatro fatores principais impulsionam o aumento do uso dos serviços de saúde no Brasil: demanda reprimida, agravamento de condições crônicas ou diagnósticos tardios, sequelas da Covid-19 e o influxo de novos usuários demandando mais atendimento”, explica Joaquim.

“Esses fatores têm levado a um aquecimento no uso dos serviços de saúde nos últimos anos, beneficiando os hospitais em termos de receita. No entanto, os custos dos insumos e despesas com pessoal, como dissídios salariais, continuam elevados. Para as operadoras de planos de saúde, a demanda reprimida está começando a impactar fortemente suas finanças, resultando em dificuldades significativas. O setor de saúde no Brasil está enfrentando um problema grave de sustentabilidade financeira”, destaca Joaquim.

Segundo ele, a consolidação do mercado, fusões e aquisições e verticalização devem marcar o ano. No Brasil ainda tem acontecido muitas consolidações, apesar do ambiente instável – muitos hospitais comprando outros, operadoras comprando operadoras, ou seja, grandes grupos se consolidando. E está havendo bastante verticalização (criação de redes próprias de serviços, hospitais, laboratórios, etc.) para controlar os custos e enfrentar esse momento. O mercado de saúde é um setor alvo de investimentos em M&A (fusões e aquisições), mas desde o ano passado há um desaquecimento da busca por esse tipo de operação. Muito em função de instabilidade econômica e política do país, principalmente por conta do processo eleitoral que marcou o ano passado, alta dos juros e quantidade de IPO (abertura de capital de empresas) diminuindo drasticamente.

Um desafio apontado pelo consultor diz respeito às mudanças regulatórias no setor de saúde. A necessidade de lidar com as demandas crescentes e a pressão financeira, juntamente com mudanças regulatórias recentes, como a regulamentação do autismo, a PEC da Enfermagem e a transição do Rol Taxativo para o Rol Exemplificativo estão gerando insegurança jurídica e aumentando o peso financeiro sobre as organizações do setor de saúde. Essas mudanças serão fatores marcantes para o setor nos próximos meses.

Outro desafio, segundo Joaquim, são as fraudes contra o sistema. As operadoras de planos de saúde têm enfrentado um problema recorrente de fraudes, representando um grande desafio para o mercado. Um estudo da Abramge (Associação Brasileira de Planos de Saúde) mostra que 135 inquéritos policiais foram abertos para apurar esquema fraudulento contra três das cinco maiores operadoras do país. Essas se multiplicaram no pós-pandemia. São práticas variadas, que usam recibos superfaturados ou que declaram tratamentos estéticos como procedimentos médicos e clínicas de fachada criadas apenas para atestar serviços inexistentes. Esse tipo de crime impõe uma dificuldade e perdas financeiras muito altas às operadoras: a Abramge aponta que houve um salto de R$ 6 bilhões nos reembolsos em 2019 para quase R$ 11 bilhões em 2022. “À medida que o setor de saúde brasileiro enfrenta esses desafios, as organizações estão se reorganizando financeiramente e buscando maior eficiência para garantir sua sustentabilidade no mercado”, conclui Joaquim.

Principais desafios globais do setor de saúde, de acordo com relatório da Deloitte

De acordo com o estudo, no próximo ano, os players do setor de saúde, como prestadores, governos e reguladores, devem considerar a melhor forma de traduzir as lições aprendidas sobre a prestação de cuidados de saúde digital durante a pandemia da Covid-19 em: melhor acesso e tratamento; aproveitar a tecnologia para reduzir custos e demandas dos profissionais de saúde e, ao mesmo tempo, melhorar o atendimento aos pacientes; reduzir a sua pegada de carbono e, assim, ajudar a mitigar algumas das ameaças ambientais à saúde pública; aliviar o estresse da força de trabalho reformulando o escopo dos requisitos, permitindo mais trabalho remoto e fornecendo melhores serviços de suporte; e preparar melhor as instalações, cadeias de suprimentos e parcerias considerando futuras pandemias, situações de saúde pública ou desastres naturais.

Prestação de cuidados de saúde digital. Novas formas de prestação de cuidados têm o potencial de informar, personalizar, acelerar e aumentar a capacidade dos profissionais de saúde de cuidar de pacientes. A saúde digital apresenta uma oportunidade de mudar vidas e fazer a diferença para as pessoas em todo o mundo, inclusive para os que têm acesso limitado – ou nenhum – a qualquer forma de cuidados médicos ou medicamentos modernos. Um dos primeiros passos para ingressar na saúde virtual é a adoção de Registros Eletrônicos de Saúde, que podem fornecer uma imagem mais abrangente da população, bem como da saúde individual. À medida que mais tecnologia de saúde digital é incorporada aos processos clínicos por meio de computação em nuvem (cloud computing), aprendizado de máquina (machine learning) e dispositivos conectados à internet, pode-se reduzir significativamente os custos de atendimento. Além disso, a tecnologia oferece uma solução para a escassez de profissionais de saúde.

Os serviços de saúde mental foram vistos na vanguarda da saúde digital durante a pandemia de Covid-19 e, atualmente, estão em crescimento entre outros usuários. Os aplicativos são vistos ajudando a melhorar o bem-estar geral, incentivando mudanças de comportamento, como nutrição, ingestão de água, sono e atividade física, além de gerenciar condições de saúde mental, como ansiedade ou depressão. A adoção de consultas virtuais aumentou (de 14% em 2018 para 67% em 2022), mas outras modalidades digitais de saúde estagnaram, como os resultados de pacientes reportados via aplicativos, monitoramento remoto de pacientes em domicílio e integração de dados dos dispositivos vestíveis (weareables) com registro médico do paciente, por exemplo, de acordo com dados de uma pesquisa feita com médicos nos Estados Unidos pela Deloitte.

Transformação Digital. Transformação digital é redefinir o futuro dos cuidados de saúde e da prestação de serviços para reduzir custos, lidar de forma mais eficaz com a mudança dos padrões de demanda, abordar uma força de trabalho clínica em redução e se preparar melhor para a próxima crise global de saúde. A Covid-19 acelerou a mudança para tecnologias baseadas em nuvem projetadas para fortalecer as operações de negócios e impulsionar mais interações com os clientes para o mundo digital. Essa tendência está forçando os grandes provedores de Registros Eletrônicos de Saúde a migrar seus produtos e serviços para a nuvem e desenvolver parcerias com provedores de Gerenciamento de Relacionamento com o Cliente (CRM) e Planejamento de Recursos Empresariais (ERP).

Tecnologias emergentes, como Inteligência Artificial (IA), telessaúde, blockchain e dispositivos de monitoramento, como dispositivos vestíveis e ingeríveis, estão fornecendo dados contínuos e em tempo real sobre a saúde e meio ambiente. Devido ao aumento da exposição à tecnologia em nuvem, os hospitais já são os principais alvos de ataques de ransomware e outros crimes cibernéticos. Uma maneira de evitar os ataques seria aplicar a tecnologia blockchain aos dados de saúde.

Os investimentos em tecnologia em saúde continuam a crescer a um ritmo sem precedentes. A Covid-19 impulsionou os provedores a acelerar mudanças tecnológicas com base em nuvem e desenvolver parcerias com provedores de CRM e ERP. De acordo com dados da Deloitte, o volume de financiamento em health techs saltou de US$ 1,1 bilhão, em 2011, para US$ 29,1 bilhões em 2021.

Equidade em saúde. O ecossistema global de saúde apresenta disparidades com base na idade, localização, gênero, renda, raça, etnia, religião e orientação sexual, apesar dos esforços significativos para eliminá-las. A pandemia de Covid-19 afetou desproporcionalmente os grupos mais vulneráveis e, como resultado, muitas organizações de saúde estão repensando como lidar com a desigualdade no setor. Os determinantes sociais, econômicos e ambientais, que juntos definem a qualidade da saúde da população, podem ter um impacto maior nos desfechos de saúde do que somente o serviço médico oferecido.

Uma das chaves para medir a equidade em saúde é a expectativa de vida da população. Casos em que as pessoas moram na mesma região e têm diferenças significativas em suas expectativas de vida evidenciam os fatores de desigualdade que foram amplificados pela pandemia, como o acesso à alimentação, creches, moradia e renda. O racismo e o preconceito também ameaçam a adoção de novas tecnologias que poderiam prestar um melhor atendimento às populações carentes.

A telemedicina é um componente-chave da transformação digital, mas não foi adotada por todas as populações igualmente. Nos EUA, o setor de saúde está sob pressão para reduzir gastos, mesmo aumentando a qualidade dos cuidados para populações carentes. Com o tempo, o custo das desigualdades persistentes em saúde pode ter um impacto substancial nos resultados e gastos com saúde: atualmente estimados em US$ 320 milhões, os custos com desigualdade podem chegar a US$ 1 trilhão em 2040.

Força de trabalho. A pandemia de Covid-19 agravou os desafios existentes da força de trabalho nos cuidados de saúde e resultou em mudanças fundamentais na forma como o trabalho é feito. As organizações precisam de um novo pensamento sobre a força de trabalho e como estruturá-la para tornar os cuidados de saúde mais sustentáveis e eficazes e produzir melhores resultados para os pacientes. Até 2030, o setor de saúde global precisará de cerca de 80 milhões de trabalhadores a mais para atender à demanda, e cerca de 18 milhões deles serão necessários para países de baixa renda. No entanto, mesmo que a demanda por profissionais aumente, médicos e enfermeiros dizem, cada vez mais, que planejam reduzir suas horas de trabalho.

Com as mudanças nas demandas do local de trabalho, os prestadores de cuidados de saúde estão criando ambientes de trabalho mais atraentes e sustentáveis, concentrando-se em melhorar a cultura e as comunicações no local de trabalho, bem como priorizar os serviços de saúde mental para profissionais e pacientes. A escassez de habilidades, combinada com a crescente pressão de margem, levou muitas instituições de saúde a se voltarem para a tecnologia e novas abordagens, como telemedicina, com o objetivo de resolver essas lacunas e gerar maior eficiência relacionada a custos.

A automação no setor de saúde é mais prevalente para tarefas administrativas – como codificação para faturamento e documentação clínica, prescrição de medicamentos e registros de gráficos e anotações de visitas – do que para atividades diretas de atendimento ao paciente – como visitas de pacientes para cuidados de rotina e responder às perguntas dos pacientes, comunicar os resultados de testes e passar instruções de alta.

Sustentabilidade. As alterações climáticas constituem um risco para a saúde e o bem-estar humano. Os prestadores de cuidados de saúde enfrentam o desafio de manter a qualidade dos cuidados em face da crescente pressão financeira, ao mesmo tempo que tratam as crescentes consequências das alterações climáticas para a saúde. Responder de forma eficaz às alterações climáticas exige uma maior resiliência e sustentabilidade dos sistemas de saúde. As organizações de saúde devem estar preparadas para prestar cuidados pós-desastres naturais, garantir o fornecimento de medicamentos em meio a surtos de doenças relacionadas ao clima e adotar práticas que reduzam o desperdício.

Embora as emissões continuem sendo um dos maiores desafios, as instituições de saúde também estão procurando maneiras de reduzir o desperdício e aumentar a sustentabilidade. Mais fornecedores estão adotando programas de reciclagem e gerenciamento de resíduos, substituindo materiais descartáveis por materiais reutilizáveis e adotando fornecedores locais sempre que possível para minimizar as interrupções no fornecimento. A pandemia acrescentou uma urgência para tornar as cadeias de suprimentos mais sustentáveis. Portanto, os prestadores de cuidados estão procurando melhorias nos métodos de entrega, como o atendimento virtual. Se o setor de saúde global fosse um país, seria o quinto maior emissor global de gases de efeito estufa. O setor contribui para 5% das emissões mundiais.

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