Quando pensamos em saúde, é natural associar diagnósticos a números claros e objetivos, como os de exames de sangue. Por exemplo, o colesterol: se estiver acima de 190 mg/dL, o médico sabe que algo está desregulado. Essa referência é um guia confiável e objetivo para a tomada de decisão médica.
No entanto, a mesma lógica não se aplica diretamente à neurologia, onde parte dos diagnósticos são clínicos e, portanto, mais subjetivos. Eles dependem da experiência do médico e de sinais que nem sempre são visíveis e precisos.
Neste contexto, acredito que a subjetividade pode ser significativamente reduzida com o auxílio da Inteligência Artificial (IA) na identificação de neurobiomarcadores, padrões mensuráveis no cérebro que funcionam como guias objetivos para neurologistas, assim como exames de sangue são para outras áreas da medicina. Imagine um exame de eletroencefalograma (EEG) aliado à IA fornecendo com alta precisão informações sobre sinais iniciais de epilepsia ou até de doenças degenerativas.
Diferente de áreas como radiologia ou cardiologia, a neurologia teve avanços tecnológicos limitados, em grande parte pela escassez de big data para desvendar um órgão tão complexo quanto o cérebro.
No entanto, algumas iniciativas no segmento de negócios em saúde estão transformando esse cenário ao oferecer plataformas integradas e eficientes, capazes de reduzir drasticamente o tempo necessário para laudar exames neurológicos. O mercado atual é dominado por soluções fragmentadas e softwares genéricos que não foram projetados para processar dados neurológicos, resultando na ausência de tecnologia dedicada para a análise do funcionamento cerebral. Isso gera exames de alto custo e aumenta o risco de falhas humanas.
Olho no futuro
Mas o que realmente torna essa transformação possível é a visão de futuro. Grandes avanços em saúde sempre surgiram da interseção entre ciência, tecnologia e visão empreendedora.
Hoje, estamos em um ponto de virada, em que a IA na saúde deixou de ser uma promessa distante para se tornar uma realidade transformadora. Para que essa revolução atinja todo o seu potencial, porém, é essencial que todos os agentes da cadeia de saúde estejam alinhados e comprometidos com essa mudança.
No Brasil, o Sistema Único de Saúde (SUS) enfrenta desafios históricos. Cerca de 3 milhões de pessoas aguardam na fila para exames especializados, muitas com suspeitas de condições neurológicas que dependem de diagnósticos rápidos e precisos para evitar agravamentos.
O tempo médio de espera por exames como EEG e ressonância pode ultrapassar seis meses na capital de São Paulo, comprometendo os desfechos clínicos e sobrecarregando ainda mais o sistema. Soluções tecnológicas podem ajudar a aliviar essa pressão, oferecendo diagnósticos mais rápidos e precisos, otimizando o uso de recursos escassos e permitindo que mais pacientes sejam atendidos em menos tempo.
O futuro da saúde neurológica, portanto, está intimamente ligado à capacidade de inovar e integrar tecnologias que possam fornecer dados objetivos e precisos. Ao fazer isso, poderemos transformar os desafios atuais em oportunidades, garantindo um atendimento mais ágil e preciso para todos. Com a colaboração de todos os agentes do setor, desde desenvolvedores de tecnologia até profissionais de saúde, podemos vislumbrar um futuro onde diagnósticos neurológicos sejam tão claros e confiáveis quanto um exame de sangue. Juntos, estamos construindo esse futuro promissor.
Cristhian Cagliari Carniel, CRO da Neurogram.