Diagnósticos mais rápidos, tratamentos mais precisos e um cuidado que se amplia para além dos grandes centros urbanos. Todos estes são elementos cada vez mais presentes em um ecossistema médico moldado por tecnologias. Prontuários eletrônicos, sistemas de registro médico, plataformas de gestão clínica são inovações que já estão integradas à rotina de hospitais, clínicas e farmácias, reorganizando processos, aumentando a segurança e abrindo espaço para uma nova lógica de cuidado eficiente, conectada e centrada no paciente.
Mais do que somente recursos, o avanço se torna ainda mais promissor diante da chegada de uma nova geração de profissionais. Atualmente, o Brasil conta com cerca de 600 mil médicos, e a expectativa é de que esse número ultrapasse a marca de 1 milhão até 2035, segundo dados do estudo Demografia Médica 2025. Isso significa que, progressivamente, o setor passará a ser composto por nativos digitais, pessoas familiarizadas com a tecnologia desde sua formação, impulsionando a aceitação e o uso natural das ferramentas no cotidiano do cuidado.
No entanto, para que a evolução verdadeiramente ganhe escala e profundidade, não basta o cenário adequado. É preciso intenção. Desde gestores, profissionais da linha de frente da saúde, além de formuladores de políticas precisam contribuir ativamente para que a digitalização seja notada como parte estratégica da jornada de transformação do setor.
A combinação entre avanços tecnológicos e um corpo médico mais preparado para utilizá-los cria uma conjuntura favorável para a inovação ganhar escala, e as consequências são animadoras: maior acessibilidade ao atendimento, capacidade de escalar serviços antes limitados geograficamente e, principalmente, redução de custos operacionais sem perda da qualidade do cuidado.
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Diante desse terreno fértil, a tecnologia precisa passar a ser um agente ativo de mudanças para o cuidado. A digitalização viabiliza, por exemplo, que especialistas atuem remotamente em áreas restritas ou de difícil acesso, oferecendo teleconsultas, laudos à distância e orientação clínica especializada a locais antes carentes desse tipo de cuidado. Mais do que isso, o uso de tecnologia permite que especialistas do mundo todo possam acompanhar ou examinar um paciente a milhares quilômetros de distância, ou ainda espalhar o seu conhecimento para que mais médicos tenham acesso a sua expertise.
Nesse processo de transformação, a percepção do paciente também está evoluindo. O atendimento online, embora ainda recente na cultura brasileira, tem se mostrado uma potência na forma de receber saúde. Consultas virtuais, acesso a exames em plataformas digitais e acompanhamento remoto por aplicativos estão se tornando cada vez mais comuns. Essa nova lógica amplia o conforto, a conveniência e o protagonismo do paciente em sua própria jornada de cuidado, mudando profundamente a forma como o atendimento é entregue e, sobretudo, percebido.
Essa mudança de perspectivas também abre caminho para o impulsionamento de um novo modelo assistencial: a Saúde Baseada em Valor (SBV). Diferente da lógica tradicional centrada na quantidade de atendimentos e procedimentos, a SBV prioriza a qualidade do cuidado, os resultados clínicos, a experiência do paciente e a eficiência dos recursos utilizados. Isso posto, a tecnologia é essencial para viabilizar essa transição, pois permite o rastreio de indicadores, a análise de desfechos e o acompanhamento longitudinal do paciente, elementos vitais para mensurar e aprimorar o valor entregue à população.
Toda essa somatória, obviamente, resulta num otimismo justificável para o setor, mas ainda existem barreiras relevantes que precisam ser superadas para que esse futuro promissor se concretize plenamente. A principal delas é a falta de entendimento, por parte dos gestores, sobre o verdadeiro valor desses recursos. É compreensível que, em uma área onde o erro pode ser fatal, haja resistência ao uso intensivo da tecnologia. Porém, é justamente pela criticidade da medicina que faz-se essencial o uso de ferramentas que potencializem a precisão e a segurança do cuidado.
Para mudar esse cenário, é indispensável um esforço intencional de construção de awareness em torno do uso da tecnologia na saúde. Decisores precisam compreender, com clareza, os benefícios e o retorno desses investimentos. Isso exige atenção às objeções existentes, sejam elas ligadas à governança, compliance ou mesmo ao conservadorismo estrutural do setor. A superação dessas barreiras passa por uma abordagem mais transparente e objetiva da proposta de valor dessas ferramentas.
Além disso, é necessário repensar a forma como esses recursos são avaliados e metrificados em si. O grande desafio atual está na mensuração de resultados e na comparação eficaz entre o “antes” e o “depois” da digitalização. Será preciso intenção e também estratégia para estruturar indicadores sólidos que traduzam esse impacto. Quantos casos de diabetes puderam ser controlados com ferramentas digitais? Quantos cânceres foram diagnosticados precocemente? Qual a redução real de internações por hipertensão? Métricas palpáveis como essas precisam ganhar protagonismo para evidenciar o valor prático da transformação digital.
O caminho está traçado, e os primeiros passos já têm sido dados. Com um ecossistema cada vez mais propício à inovação e uma nova geração de médicos aberta à tecnologia, o futuro da medicina no Brasil tende, sim, a um trajeto promissor. A digitalização da saúde vai muito além de uma evolução técnica, mas uma revolução cultural. E com o direcionamento certo, ela pode finalmente cumprir seu maior propósito: cuidar mais e melhor de todos.
Guilherme Weigert, CEO da Conexa.
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