A participação do cirurgião-dentista nas equipes de atenção à saúde no âmbito hospitalar, seja nas Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) ou no atendimento de traumas, especialmente cabeça e boca, é cada vez mais imprescindível. A odontologia hospitalar consiste em um conjunto de ações preventivas, diagnósticas e terapêuticas de doenças orofaciais, manifestações bucais de origem sistêmicas ou de sequelas de seus respectivos tratamentos, em pacientes em ambiente hospitalar (internados ou não) ou em assistência domiciliar, inseridas no contexto de atuação da equipe multiprofissional, visando a manutenção da saúde bucal e a melhoria da qualidade de vida.
Reconhecida como área de atuação pelo Conselho Federal de Odontologia (CFO) em 2015, a odontologia hospitalar está se consolidando como medida fundamental no tratamento de pacientes que estão em UTIs clínico-cirúrgicas ou de emergência.
O trabalho dos profissionais de odontologia, bem como a necessidade dessa atuação no ambiente hospitalar, ganhou maior evidência durante a pandemia da covid-19. A coordenadora da odontologia do Hospital São Paulo e professora adjunta da disciplina de cirurgia de cabeça e pescoço na Escola Paulista de Medicina e Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Denise Caluta Abranches, afirma que, na ocasião, houve um boom no setor.
Denise, que foi a primeira brasileira a receber a vacina Oxford ainda em fase de teste, lembra que no auge da pandemia, durante as inúmeras entrevistas que concedeu, foi muito questionada sobre a presença de cirurgiões-dentistas atuando em UTIs. “O cirurgião-dentista executa um trabalho importante junto aos pacientes. Cuidar de forma plena requer cuidar também da saúde bucal. A saúde começa pela boca, então o papel do cirurgião-dentista na UTI é fundamental”.
Atuação da odontologia hospitalar
A odontologia hospitalar atua na redução de focos infecciosos que podem trazer agravos sistêmicos aos pacientes, como observa o cirurgião-dentista, coordenador da comissão de odontologia hospitalar do CFO e docente da disciplina de odontologia hospitalar da Universidade Metropolitana de Santos (Unimes), Keller de Martini.
“A presença do profissional de odontologia atuando de forma preventiva e curativa traz uma melhora na qualidade de vida do paciente hospitalizado, bem como a redução de custos ao hospital. A visita regular do Cirurgião-Dentista, aliada a um tratamento realizado em conjunto com a equipe multidisciplinar do hospital, favorece os pacientes com baixa imunidade, entre eles os oncológicos, transplantados, com doenças cardiovasculares e renais”, diz ele.
A implantação da odontologia hospitalar nas UTIs teve impactos positivos, segundo estudo realizado pela USP – Ribeirão Preto. Dados analisados entre 2016 e 2018 mostraram redução de 21,4% da mortalidade em UTIs clínico-cirúrgicas. Keller explica que a presença dos cirurgiões-dentistas nas UTIs pode contribuir para a redução do tempo médio de internações, racionalizar o uso de antibióticos de alto custo, além de diminuir a necessidade de exames complementares e de imagens.
Além de atuar ao lado de pacientes na UTI (inclusive entubados), o cirurgião-dentista também atua em casos de traumas, especialmente na região da face. Nesses casos, o especialista informa que, no primeiro momento, quem receberá o paciente será o cirurgião bucomaxilofacial, que fará os procedimentos no centro cirúrgico, bem como o acompanhamento. “Após a liberação do cirurgião bucomaxilofacial, a equipe de Odontologia Hospitalar acompanhará o paciente e trabalhará para redução de focos infecciosos que podem trazer agravos sistêmicos aos mesmos”, explica.
Apesar dos resultados significativos, inclusive no tocante à manutenção da vida, não existe ainda a obrigatoriedade da presença dos cirurgiões-dentistas nas UTIs. Segundo Keller, é importante ressaltar que há várias leis municipais e estaduais inserindo a presença do profissional no âmbito hospitalar.
Ele lembra, ainda, que está em tramitação uma lei federal que também pede a regulamentação da odontologia hospitalar em todo o Brasil. “Nossa luta continua para que tenhamos profissionais capacitados e habilitados para atender os pacientes no âmbito hospitalar, pois a população precisa muito do atendimento odontológico, principalmente trabalhando na redução de focos de infecção, visando a melhoria na qualidade de vida e a sua mais breve desospitalização”.