Intenso é uma boa palavra para descrever o ano de 2016 no Brasil. De surtos virais, como da zika, a Olimpíadas; de impeachment presidencial a Propostas de Emenda à Constituição (PEC), entre as quais a polêmica PEC 55; todas as ocorrências vieram num cenário de crise econômica, só para deixar a missão dos gestores ainda mais desafiadora. E mesmo sendo um setor essencial, a Saúde foi, claramente, afetada diretamente por todo esse movimento.
A retração econômica foi impiedosa. Como reflexo do desemprego – entre agosto e outubro, a população desocupada somou 12 milhões de pessoas, um aumento de 3,8% sobre o trimestre de abril a junho de 2016 e de 33,9% frente ao mesmo trimestre de 2015 – em torno de 1,5 milhão de pessoas perderam seus planos de saúde. Além das operadoras, hospitais, laboratórios e demais entidades das redes credenciadas foram impactados quase que instantaneamente pela redução de atendimentos e procedimentos, pela verticalização que chegou para ficar e ainda pelos atrasos e glosas nos pagamentos realizados pelas operadoras.
A perda de usuários pelas operadoras gera ainda mais gargalos na Saúde Pública. Só em São Paulo, segundo dados de mercado, a fila para a realização de exames na rede municipal cresceu 56% em 2016. Atualmente, 347 mil pessoas aguardam para realização de procedimentos simples, como endoscopia, ou mais complexos, como tomografia computadorizada. O tempo de espera pode passar de cinco meses.
E as previsões seguem desanimadoras: o quadro de funcionários continua encarecendo, já que as renegociações salariais anuais elevam em uma média de 10% o custo com o corpo clínico e demais colaboradores. Além disso, até 2036, a população brasileira terá crescido 10,1% e, a proporção de pessoas com mais de 60 anos passará de 12% para 21% do total. Isso representa maiores custos nos tratamentos, graças, principalmente, ao potencial de evolução na incidência de doenças crônicas. Daria até para afirmar que a conta não fecha.
Daria. A boa notícia é que há formas para sair desse cenário crítico.
Não foi um ano fácil, mas a crise e todas as suas decorrências podem ajudar a colocar uma empresa em patamares melhores. As crises nos fazem sermos muito mais criteriosos e exigentes com nossos padrões de gestão e de resultados. É na hora da chuva que se aproveita para reformar a parte interna da casa, que ninguém de fora vê, mas muito incomoda quem está na parte de dentro, vendo a goteira pingar.
Isso demanda esforço, quebra de paradigmas e mudanças culturais. Acima de tudo, requer levantar mais cedo e trabalhar mais. O caso de um hospital privado, com o qual tive contato recentemente, ilustra bem esse ponto. Impactada pela perda de pacientes – ocasionada pelo encolhimento no número de beneficiários de planos de saúde – a entidade teve de tomar medidas para diminuir seus custos, já que o aumento da receita seria impossível. O gestor fez uma reestruturação de equipe, diminuindo a distância e intermediários entre si e as áreas de operações, reduzindo o quadro de funcionários ou os salários. Com ajuda de tecnologias de gestão, conseguiu automatizar processos e economizar fortemente com backoffice, além de ser amparado com análise de dados que melhoraram o atendimento e a segurança dos pacientes. Como resultado, houve um aumento de produtividade e um enorme ganho em termos de rentabilidade. A receita bruta se manteve, mas o dinheiro que ficou na casa aumentou.
Já disse em outros textos, e repito: não há mais lugar para ineficiência. Na verdade, nunca teve, mas viemos num processo de endividamento permitido graças ao aumento de clientes ocasionados pelo aquecimento da economia. O cenário mudou, e é preciso se adaptar. A primeira coisa a se fazer é um orçamento com base zero para 2017, ou seja, desconsiderando a possibilidade de crescimento. O que deve ser buscado – assim como no caso do hospital exemplificado nas linhas anteriores – é eficiência, traduzida em expectativa de aumento da rentabilidade. O ideal é separar cada investimento como um projeto independente, para que haja um acompanhamento individual de seus indicadores. Isso facilita a identificação do que está dando certo e o que precisa ser melhorado.
Não vejo uma melhoria muito significativa no cenário de Saúde para os próximos dois anos, em termos de aumento de receita. Prevejo, por outro lado, um forte risco de elevação dos custos, pelos motivos que já listei. Está na hora de os hospitais reverem contratos. Está na hora de buscar rentabilidade. Está na hora de demonstrar toda a habilidade dos gestores de alto nível, que fica escondida “nos tempos em que o sol arde lá fora”. E essas medidas não podem mais esperar.
Paulo Magnus, presidente da MV.