A relação entre os planos de saúde e seus usuários nunca foi fácil. Historicamente, os contratos coletivos não estão sujeitos ao mesmo rigor regulatório aplicado pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) aos individuais, cujos reajustes são limitados.
Essa diferença decorre da crença de que as negociações comerciais realizadas entre empresas e operadoras são paritárias. Contudo, essa suposição de equilíbrio não corresponde à realidade, onde os consumidores comumente estão em uma posição de clara desvantagem, como evidenciam os dados recentes.
A ANS registrou que o aumento médio dos planos coletivos no período entre dezembro de 2023 e fevereiro de 2024 foi de 15%, afetando principalmente os contratos menores, de até 30 beneficiários. Os dados revelam que os planos de saúde aproveitam a menor capacidade de negociação de pequenas organizações para impor aumentos mais predatórios, atestando a falta da equidade hipoteticamente presente nas negociações entre as empresas e operadoras.
Juridicamente, é viável a revisão de contratos quando há disparidade evidente entre as partes, sendo imprudente permitir que as operadoras transfiram o risco de sua atividade (o sinistro) para o consumidor final através do aumento deliberado das mensalidades.
Aqui, a possibilidade de alterar os contratos nos casos de desequilíbrio é especialmente pertinente: a natureza essencial dos serviços que os planos pretendem oferecer requer uma abordagem mais zelosa, onde o bem-estar do consumidor deve ser a prioridade. Nesse âmbito, as assimetrias representam mais do que injustiças comerciais, pois afetam a saúde pública e a dignidade humana.
Ora, aqueles que investem no setor da saúde têm plena ciência de que lidam com um direito fundamental, não com um serviço comum, apenas sujeito às forças de oferta e demanda ou às normas contratuais.
A natureza da assistência à saúde impõe aos planos uma responsabilidade especial, que transcende as normas contratuais comuns, devendo-se garantir, portanto, que qualquer ajuste de preços seja justo, transparente e proporcional, refletindo razoavelmente os custos de sua operação, sem comprometer, contudo, o acesso contínuo dos consumidores aos serviços que lhes foram oferecidos.
Ao contrário de outros setores econômicos, este não pode ser deixada à mercê de práticas mercadológicas que ignoram a realidade socioeconômica e a vulnerabilidade dos seus usuários. É evidente que a ANS deveria atuar de forma mais incisiva, estabelecendo critérios de reajuste aos contratos coletivos. Nesse contexto, a regulação não é apenas uma necessidade técnica, mas uma questão de justiça social!
Luan Mazzali Braghetta, advogado graduado pela PUC-Campinas, pós-graduando em Direito Tributário pela mesma universidade, com atuação nas áreas contratual, notarial e contencioso cível (execução fiscal). Atua no escritório Stéfano Ferri Advocacia.